Nos arrastões, os porões já se dividiam entre a área de salga e a de congelação, pois pescavam-se outras espécies, como a solha, a raia ou o ‘red fish’, mas continuavam a encher-se até acima, espalhando pelo navio “o cheiro intenso” da salmoura e do bacalhau que era absorvido pela madeira do porão.
Na ponte de comando, o conjunto de equipamentos tecnológicos composto por sondas, radares e VHF para comunicar com outros navios já simplificava a deteção dos bacalhaus e ajudava na navegação. Mas o trabalho continuou a ser duro.
“Por aquilo de que me apercebi em conversas com o meu pai e outras pessoas mais antigas, a vida no tempo da linha seria muito dura. No entanto, no tempo que passei na pesca continuei a achar que era uma vida dura. Com outras regalias, com outros meios, mas sempre uma vida dura”, salienta Carlos Parracho, que passou pela Terra Nova, pela Noruega e também pelas Falkland para ir pescar lula.
Uma experiência que se tornava mais intensa devido ao convívio “forçado” e prolongado num espaço exíguo: “A partir do momento em que uma pessoa vai para o mar pode regressar ao fim de três, quatro ou cinco meses e não vai a terra. São cinco meses enfiado dentro de um navio pequeno, com 40, 50 pessoas que têm de conviver constantemente, que têm de trabalhar em equipa”, um trabalho com um mínimo de 12 horas diárias e pouco tempo para o descanso e, por vezes, com momentos trágicos. “Houve muitos bons momentos, passou-se bons bocados, mas essencialmente os que ficam são os mais difíceis e o pior de todos é perder alguém”, desabafa o Carlos Parracho. Foi o que aconteceu nas Falkland quando um pescador caiu do navio durante a manobra de recolha de rede e desapareceu: “Perdemos muitas horas à procura dele, nós e mais 20 navios que estavam connosco.” Uma “infelicidade” que deixou o navio “num estado muito complicado de gerir durante 15 dias” e marcou para sempre o capitão. Ainda assim, do tempo em que andou ao mar, entre petroleiros, contentores e navios de pesca, é este o trabalho de que sente mais saudades. “Era mais desafiante. Era um desafio todos os dias, todas as horas, era outro tipo de vivência, que agregava mais as pessoas, desde oficiais aos pescadores”, garante.