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O valor das pequenas coisas

ssyssy

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O valor das pequenas coisas

Criar um filho não é só transmitir-lhe o que deve ou não fazer-se, e o que é bom ou o que é mau.


Dia após dia, os pais enfrentam um maravilhoso desafio: educar os seus filhos. É uma tarefa interminável, iniciada no próprio momento do nascimento e que – de uma ou outra forma – durará toda a vida.

Mas "formar" um filho não é só transmitir-lhe o que deve ou não deve fazer-se, e o que é bom ou o que é mau. Não é que não necessite de aprender isso, mas existem muitas outras coisas que precisa de saber para se preparar psicologicamente e se transformar numa pessoa com pensamento próprio, livre e criativa. A criança desenvolve-se não só em função da bagagem de conhecimentos acumulados, mas faz-se e constrói-se como pessoa na sua totalidade, munindo-se de saberes, sentimentos, valores, normas e muitas outras coisas. Ainda desde muito pequena, descobre o prazer de uma carícia, o reflexo que provoca um olhar, o gozo que desperta o riso. Talvez não seja demais que nós, adultos, façamos uma paragem no caminho e dediquemos algum tempo a reflectir sobre para quê e como educar os nossos filhos. Evocar as próprias recordações, as vivências da infância, a singeleza com que olhávamos para a vida e a simplicidade com que interpretávamos aquilo que para "os grandes" era um problema. Esquecemo-nos da nossa infância e exigimos que os nossos filhos aceitem sem questionar as nossas imposições, desejos, e os muitas vezes ridículos juízos de opinião.

O valor da simplicidade

A infância assenta as suas bases na vida futura. Carrega-se com a sua recordação para sempre. É o início de uma história de vida que se irá tecendo dia a dia. A maior parte das vezes, através dos seus actos, as crianças põem em evidência aquilo que necessitam: pedem-no, insistem. E os adultos – envoltos numa nuvem de preocupações e tarefas que julgam importantes – perdem de vista o valor da simplicidade. Sem tomar consciência disso, transmitem à criança a mensagem de que o valioso é o mais caro: os brinquedos sofisticados, os mais ruidosos, os que mais botões têm, a tecnologia de ponta, o automóvel mais luxuoso... Mas, o que recordamos de quando nós próprios éramos crianças? O que sentíamos? O que pensávamos? Tanta coisa valiosa que existe no mundo! E, curiosamente, não se compra com dinheiro. Existem coisas de tamanho infinito à espera de serem vistas, uma infinidade de texturas para serem tocadas, montões de palavras à espera de serem ouvidas. Quanto temos para ver e descobrir!

A idade da inocência

Além de informação, conhecimentos, leis e normas, os nossos pequenitos necessitam de descobrir e desfrutar das coisas simples, essas que estão ao seu alcance e que incansavelmente reclamam. É nessas pequenas coisas e na simplicidade dos actos quotidianos que se esconde uma maravilhosa riqueza digna de ser explorada. Trata-se de objectos, de fenómenos, de sucessos que o adulto passa por alto. Que vê, mas não se detém para olhar. Que sabe que lá estão, mas que não lhes acha o sentido. São "aquelas pequenas coisas" que, por julgar que se está a perder tempo, não se dignam observar. Acontecem, então, certos factos na vida das crianças que são afastadas pelos "grandes" com um "Não!" rotundo e repressivo. Não seria proveitoso permitir-lhes que façam aquilo que pretendem? Que tão humildemente tentam aprender a desfrutar. "Não sujes o vidro". Quem não se entreteve desenhando uma e outra vez sobre um vidro embaciado numa tarde chuvosa e fria? "Sai da água que te estás a molhar". Mas, não era lindo brincar com a água? Mudá-la, pôr barquinhos a navegar, dar banho à boneca, agitá-la para fazer espuma? Quando a banheira se transformava num oceano, uma miniatura era uma imensidade... Como esquecê-lo!

"Não te metas nos charcos". Que experiência única! Saltar uma, duas, três vezes até que o charco deixasse de sê-lo para se transformar num buraco lamacento. "Não te sujes que estragas a roupa!". Que prazer era encher as mãos de barro, misturá-lo com ervas cortadas para cozinhar para a boneca, ou construir fortalezas para os índios, ou fazer túneis que se juntavam debaixo da terra? A verdade é que o vidro se suja, mas pode voltar a limpar-se; a roupa molha-se, mas bem depressa secará; o barro mancha, embora a água o possa lavar. Se não se permite que a criança faça estas coisas agora que tem dois, quatro ou oito anos, quando chegará a altura em que possa fazê-las? Porque privá-la desses prazeres tão puros, tão simples, que estão, pelo seu lado, cheios de saudáveis sensações e recheados de emoção?

Pequenos mestres

Os olhos de uma criança deslumbram-se perante uma gota de orvalho sobre a folha de uma planta, e abrem-se de surpresa ao ver o longo caminho percorrido por um caracol. Poucos "fenómenos" poderiam desenhar nesse pequeno rosto o fascínio que experimenta nesse momento único. É assim que eles descobrem o universo e se deliciam perante espectáculos dos quais se sentem participantes e, às vezes, até criadores. Observam, analisam, sentem, exploram, aprendem. São esses actos que conservam a grandeza da simplicidade, a beleza do natural e a imponência do que é pequeno. As crianças têm muito que ensinar-nos. Diferentes dos adultos, elas estão sempre dispostas a fazê-lo. E mais, fazem-no sem que ninguém lho peça. São os nossos grandes mestres. Dizem-nos as coisas sem rodeios, contam-nos o que pensam tal como lhes surge na mente, sem organizar demasiado a sintaxe ou respeitar estritamente a semântica. As crianças transmitem-nos essa capacidade de assombro e admiração por aquilo que, de tão evidente, às vezes não conseguimos ver. A única coisa a fazer – se ainda quisermos aprender – é deter-nos em silêncio, olhá-las nos olhos com ternura, sorrir, e esperar. As suas palavras esclarecedoras não tardarão a chegar.
 
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