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MISSÃO NO BUNGO (pessoas sensiveis é favor não ler)

ferny

GF Prata
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Out 12, 2007
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MISSÃO NO BUNGO




Fica para a nobre história dos pára-quedistas a determinação deste jovem oficial.
Sendo reduzidos os efectivos de pára-quedistas para acorrer à defesa das populações mais afectadas pelos ataques da UPA, os contingentes actuavam em grupos de sete a dez elementos, comandados por oficiais ou sargentos pára-quedistas. Como tantas outras povoações, o Bungo era uma das situações complicadas devido aos constantes ataques das hordas terroristas da UPA. O Alferes pára-quedista, Manuel Jorge Mota da Costa, avançou para o Bungo em socorro das poucas dezenas de colonos brancos que lá permaneciam, já esgotados e desmoralizados. Tendo em conta a povoação situada num planalto, logo tratou de dispor de todos os meios na defesa mais eficaz e segura. Percebendo que o pessoal civil estava desgastado e confuso, em 8 de Maio de 1961, pela manhã, redigiu um comunicado à população, que ajudou a melhorar o moral e a desanuviar o desânimo:


“DEFESA DO TERRITÓRIO NACIONAL PORTUGUÊS – à População do Bungo
Vai-se acentuando, de dia para dia, uma experiência que pode levar a certos

desmandos e desatinos, o que, aliás, já se tem verificado. Peço, portanto,

a todos que se mantenham calmos, que não saiam da área dos seus postos e que,

em caso de alarme, os ocupem rapidamente em vez de se juntarem à

minha volta. Também se vai criando um movimento de desconfiança que

a todos prejudica. O momento actual não é de se porem problemas;

proponham-se soluções, mas que não fiquem susceptibilidades.
A situação é de guerra e ninguém o ignora. Medo todos nós sentimos, o que

precisamos é saber dominá-lo no devido momento. Aqueles que se não sentirem

com condições físicas e principalmente morais, que retirem, pois aqui só

prejudicam os que sabem o que querem. Aqui não há lugar para covardes,

esses que retirem também, que nós apenas os olhamos com piedade.

Se tivermos que cair que caiamos de pé, pois nas nossas veias corre

sangue português, o mesmo de há oito séculos.
A bem da defesa do território português, em qualquer parte do mundo.

” assinou o Alferes pára-quedista Manuel Jorge Mota da Costa.
Foi lido e distribuído à população; mais tarde publicado na imprensa e na

Ordem de serviço do Batalhão.

MAQUELA DO ZOMBO – Emboscadas



Já bem dentro da mata, nas proximidades dos trilhos marcados pela presença

de "caminhantes”, os pára-quedistas prepararam as emboscadas planeadas

com rigor. A secção do Groselha estava colocada mesmo no enfiamento do trilho

que vem da fronteira, a uns dois quilómetros do marco limite do norte de

Angola. Passadas duas horas, alguns bandidos carregando sacos, encheram os

olhos do soldado Serôdio, que guardava o flanco esquerdo, que logo chamou

a atenção do sargento Ferreira:
- Eh pá! Meu sargento, olhe só para aquela clareira debaixo da mangueira!
- São mais de dez, diz o Fonseca.
- Os gajos trazem um lança-granadas e armas às costas!
Num tom mais conformado, o cabo Pastilhas, mostrou o seu espanto:
- São armas novas a brilhar, com o peso, os gajos nem conseguem

andar direitos.

Ainda não toparam que estamos aqui.
Confiantes no domínio do terreno, os bandidos subiram a encosta sem

se aperceberem que estavam a ficar ao alcance da mira das armas dos

pára-quedistas.
- Estão a chegar à zona de morte, diz o sargento Ribeiro.
Ainda mal tinha acabado de falar, já o estrondo das rajadas de

metralhadora violentava o sossego da mata. Os da frente foram atingidos em

cheio e tombaram trespassados pelas balas de cabeça cortada – que fazem

um rombo irreparável. Os dois retardatários, lançaram os sacos ao chão e

fugiram mata dentro, mesmo feridos. Em cinco minutos foram abatidos sete

inimigos do povo de Angola, e as armas que carregavam ficaram no chão,

impunes... até se confirmar que não havia mais ninguém no grupo.
Demorou mais de meia hora até que a calma regressasse à floresta; tempo

mais que suficiente para cinco pára-quedistas recolherem as preciosas armas

“finas” num total de onze peças. Distribuída a carga pelas secções, foi retomada

a picada para mais uma longa caminhada até Maquela do Zombo. Essa deve ter

sido a maior apreensão de material desde Março de 1961, o que muito animou

o pessoal.

Quibocolo – ATAQUES EM MASSA



A chegada a Quibocolo foi uma surpresa aterradora. Logo na entrada da estrada que vem de

Maquela do Zombo, há cabeças cortadas à catanada espalhadas pelo chão. São dos bailundos

que ficaram para ajudar os brancos que tiveram de fugir para a Damba.

– Mas que selvajaria – diz o Alfredo!

Logo o Quaresma atalhou:

– Os turras do Holden Roberto são mesmo sanguinários para com as outras etnias de pretos. Até parece

que nem são angolanos.

– Olha Quaresma, dizem que são bacongos do Congo Belga, e até andam com alguns missionários

dos evangélicos.

As duas secções de pára-quedistas organizam-se em grupos de cinco para bater as casas e

palhotas destruídas. Alguns sacos de terra são colocados em cima do terraço de uma das casas ainda

seguras, a que se juntam uns blocos de adobe para servir de parapeito e abrigo contra os atacantes.

Ficar em abrigos no chão é o suicídio, atendendo à grande quantidade de terroristas que costumam atacar.

Chegada a noite instalam-se os primeiros pára-quedistas. As granadas e as provisões são dispostas

ao lado dos abrigos, enquanto o sargento Assis dá as últimas instruções para a defesa daquele posto:

“Muita atenção ao gasto de munições; não quero que nos aconteça o mesmo que aconteceu à malta que

esteve no Bungo, se não fossem reabastecidos pela Dornier, ao fim de três ataques já estavam a ficar

sem munições.”

Durante a noite, ouve-se um murmúrio longínquo cujo alarido indicia movimentos de terroristas nas

imediações. A alvorada traz alguma inquietação, mas não se esperam surpresas; as experiências dos

dias anteriores dão alguma confiança ao grupo. Esta calma aparente manteve-se durante todo o dia, de vez

em quando quebrada pelo chilreio das aves no meio da mata. E o Alfredo olha fixamente para a floresta,

e pergunta ao Serôdio:

– Quando foste ca*ar ao pé daqueles tufos verdes, não viste se havia lá água?

– Debaixo daquelas mangueiras nasce um pequeno fio de água.

O Alfredo sorri, puxa do cantil e bebe umas boas goladas da última reserva. Limpa a boca, calmamente

e dispara:

– Eh malta, temos água ali ao lado daquela plantação de feijões! – Virado para o sargento, diz:

– Meu sargento, é melhor enchermos os cantis enquanto isto está calmo.

– Pessoal, em grupos de três, vão reabastecer-se de água.

Um a um, descem do posto de vigia, passam pelo meio dos escombros e das cabeças espalhadas no

caminho, pedindo aos céus que chova para abafar o cheiro que invade o ambiente. Cem metros

abaixo, encontram a água a correr por entre os feijoeiros.

Partilham a frescura da água e a sombra das mangueiras que os protegem dos raios solares,

envoltos no silêncio da mata, que nem pensam na guerra. O Santos, que parece estar noutras

latitudes, interrompe a quietude do Serôdio e diz:

– Como estará o meu puto, agora com seis meses? Já ando nesta merda há mais de três meses,

missões umas atrás das outras, e a mulher nem uma fotografia me mandou!

O sargento, com a sua voz autoritária, manda:

– Quem quiser ir à água, é para despachar; aqui em cima do pátio estamos mais seguros.

Ao segundo dia plantados neste sítio longe de toda a civilização, e pouco depois da recolha de alguma

água nas imediações da estrada, um barulho de vozes vindas da mata desperta a atenção da tropa.

A meio da manhã, uma gritaria louca põe os nervos em riste e as armas apontadas em todas as direcções.

Um numeroso grupo de pretos entra pela povoação dentro, uns a disparar canhangulos contra as posições

dos pára-quedistas, outros com as catanas ao alto. Numa correria tresloucada, descarregam toda a sua

raiva contra o que resta das casas, indiferentes às balas que atingem aquela horda de bandidos suicidas.

É uma avalanche de inconscientes facínoras que, sendo muitos, uma grande quantidade consegue passar

para o outro lado da povoação; parte deles dizimados ou esfacelados pelos rebentamentos de



algumas granadas lançadas com precisão para cima dos maiores aglomerados de carne para canhão,

e as balas, de pontas cortadas, fazem um furo descomunal nos corpos que estrebucham por entre as ruínas

das casas.

Ainda mal refeitos do espectacular morticínio, os que restam daquela horda de bestas embriagadas pelo ódio,

e que conseguiram passar a barreiras de fogo, já organizam um bando com algumas centenas e voltam



a atacar nas mesmas condições, deixando mais umas dezenas de corpos espalhados no meio das ruínas

do campo desta batalha desmesurada e incrivelmente estúpida. Vista de cima do terraço, a estrada

mais parece um campo de extermínio, com manchas de sangue e cadáveres com os braços e as pernas

em posições dantescas, à mistura com as cabeças dos bailundos lambiscadas pelos mabecos e pelas

hienas – senhores da selva. O panorama era tão desagradável que o pessoal procurava desviar os olhos

para a mata, só para se livrar de sonhar com os fantasmas.

– Onde havíamos de vir parar... Fazer segurança a cabeças de preto, nunca esperei! Agora mais estes

que vão ficar a cheirar mal – diz o Alfredo.

O Serôdio, virado para o Santos, pergunta:

– Então casaste antes da tropa?

– Oh pá, quando casei já andava nos pára-quedistas a fazer o curso de combate. Antes dos pára-quedistas

já tinha seis meses de tropa no Regimento de Infantaria de Évora. Comia-se muito mal no arremacho,

e o meu primo Faísca, que era pára-quedista de 1959, disse-me que aquilo era muito bom, uma tropa

com nível e boa alimentação. Arranjou-me uma inscrição, fiz as provas com bons resultados e agora estou

aqui.

– Mas porque casaste antes de saíres da tropa?

O Santos responde com um sinal de saudade:

– Ela trabalhava comigo num restaurante de Loulé. O namoro até corria bem, mas ela engravidou e a

família pressionou que era melhor casar. Também achei bem e casei. Só que os ataques às roças do

café aqui no Norte de Angola começaram umas semanas depois, e cá vim parar.

Já a tarde se faz sentir com o rigor do sol a aquecer os camuflados que queimam a pele, quando algumas

latas de conserva servem para alimentar os corpos que ali estão expostos a vários perigos.

Com tantos cadáveres espalhados no chão, não há apetites para saborear o almoço que vem tarde,

mas o esforço exige alguma reposição de energias. Em retrospectiva das horas passadas neste

pesadelo, mais parece que se visiona um filme daqueles onde os atacantes cercam os sitiados

dentro das muralhas dos castelos, faltando apenas as escadas de assalto para serem iguais.

O resto do dia foi uma acalmia estranha, com alguns cães macaco a rondar os cadáveres. De noite,

a presença de outros animais desejosos de comer a sua refeição – porque a fome toca a todos –

ajudou na remoção daqueles corpos que já cheiravam mal e incomodavam as narinas dos pára-quedistas.

O contacto rádio com uma Dornier que passou em voo baixo deu para avisar dos perigos das carnes

em decomposição, razão por que a continuação do avanço até à Damba era urgente. E foi isso

que o comandante do grupo deixou perceber:

– Avisar maior que só temos “morfos” para hoje.

E continuou agarrado ao rádio:

– Se não mandam tropa do exército para ajudar a enterrar os mortos, queimamos esta merda toda e

seguimos para a Damba, esperando lá ordens das operações.





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crianças assassinadas por esses bandidos.





responsabilidade ferny
 
Última edição:

sagal

GF Ouro
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Set 23, 2006
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Obrigado camarada ferny pelo texto.
Revoltante para todos, normal para quem conhece na prática estas desventuras.
Não vi isto (andei por Moçambique), mas vi situações semelhantes. Na altura, não dávamos importância a estes factos (talvez razão de tantas injecções que nos davam), hoje, quando me debruço nestes pensamentos, com mais certeza fico, do quanto é estúpida a guerra.
Apenas para dizer que: não foi só africanos que vi nesta situação, também vi, corpos de de brancos retalhados por minas anti-carro.

Na guerra é assim, ou matas, ou podes morrer.
 
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