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Santarém: Entrevista “Existe discriminação das mulheres no acesso ao emprego”

C.S.I.

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Set 25, 2006
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As mulheres são as que mais sofrem o desemprego e a pobreza. Têm os ordenados mais baixos, mas ainda assim são as que acumulam mais horas de trabalho por serem as grandes cuidadoras da família. Os homens já partilham as tarefas, mas há um longo caminho a percorrer, diz a Conselheira Municipal para a Igualdade de Vila Franca de Xira, Helena Seita Gonçalves numa entrevista a O MIRANTE

A existência de uma conselheira para a igualdade pressupõe que as diferenças não estão esbatidas?

Não estão, de facto. Em termos legislativos, como em outras áreas no nosso país, estamos muito bem. A Constituição da República institui o princípio da igualdade referindo que ninguém pode ser beneficiado ou prejudicado em função do sexo, raça, religião ou orientação sexual. A realidade e as estatísticas dizem-nos que, embora os progressos nesta área tenham sido grandes nos últimos anos, estamos muito longe de uma igualdade de oportunidades e de direitos. Não queremos que os homens e as mulheres sejam iguais. O que se pretende é que as pessoas independentemente do sexo tenham os mesmos direitos e mesmas oportunidades.

A que estatísticas se refere?

Vila Franca de Xira acompanha a tendência nacional. O desemprego é sempre superior nas mulheres.

E porquê? Em alguns casos é opção da família que a mulher fique em casa...

Essa opção é cada vez mais rara, nomeadamente para as famílias da classe média que precisam dos vencimentos do homem e da mulher para sobreviver. Essas opções só acontecem em meios sociais privilegiados. O que eu acho é que existe discriminação no acesso ao emprego para as mulheres. Desde logo porque são as mulheres que são mães, que têm os filhos e isso pode ser um constrangimento para as empresas.

Mesmo quando já têm filhos?

Mas podem vir a ter mais. E não só por isso. Há determinados cargos que são tradicionalmente mais masculinos. No concelho, segundo dados do Instituto do Emprego e Formação profissional referentes a 2006, do total de desempregados 55,4 por cento eram mulheres. São também as mulheres que são mais vulneráveis aos fenómenos da pobreza e da exclusão social. São elas que mais recorrem ao rendimento social de inserção.

Como justifica esta situação?

As mulheres têm percursos profissionais mais instáveis que os homens por causa da questão dos filhos e muitas vezes estão também dependentes dos maridos. Quando há divórcio são elas que ficam com os descendentes. As famílias mono parentais, está provado, são mais vulneráveis à pobreza.

A própria sociedade ainda não se adaptou. Há jardins-de-infância que funcionam em horários incompatíveis…

Muitas vezes os horários não vão ao encontro das necessidades das famílias. Isso é também constrangimento para a empregabilidade das mulheres. Se alguém tem que prescindir dessa parte importante da vida, que é ter uma actividade profissional, são as mulheres, e não os homens.

Mas alguns já pais começam a levar os filhos ao infantário.

Naturalmente que há progressos. Basta pensar como tudo funcionava há 20 ou 30 anos… Mas as mulheres continuam a ser as principais responsáveis pelas tarefas domésticas. As mulheres trabalham em média mais três horas que os homens. Continuam a ter uma sobrecarga. Aquilo que normalmente se chama a dupla jornada de trabalho. O ritmo a que as mulheres entraram na esfera pública não é igual ao ritmo em que os homens entraram na esfera privada. É comum ouvir dizer que “o marido até ajuda”…

E não é correcto…

Quando se diz que o marido ajuda em casa está a partir-se do princípio que as tarefas domésticas são da responsabilidade da mulher. Ainda não existe partilha verdadeira. E isto também as impede muitas vezes de terem oportunidades de carreira diferentes. Muitas vezes são condicionadas por terem a responsabilidade dos filhos.

E com entrada acelerada da mulher no mundo do trabalho a situação dos filhos fica mais desprotegida? Passam a ficar mais tempo nas instituições…

A família é o primeiro espaço de socialização das crianças, mas existem outros que podem ser tão enriquecedores. O facto das crianças estarem em instituições é positivo porque têm contactos com outras crianças e estímulos. O que interessa, tanto para mães como para pais, é a qualidade do tempo que se passa com os filhos.

As desigualdades sentem-se também ao nível económico.

Parece irreal, mas é verdade que as mulheres auferem em média salários mais baixos que os homens. Em 2005 em Vila Franca de Xira as mulheres auferiam uma remuneração média mensal de cerca de 684 euros enquanto nos homens esse valor era de 891 euros.

E porque é que isso ainda acontece?

Porque há uma discriminação efectiva pelo facto de se serem mulheres. Tradicionalmente a mulher era a cuidadora e o homem o responsável pelo sustento da família. É aquilo a que chamamos de estereótipos de género e têm influência nas mais variadas áreas. Em alguns casos os homens também assumem funções de chefia com remunerações superiores.

Mas as mulheres estão em maioria nas Universidades.

Daqui a muito tempo isso obrigar-nos-á a pensar. As mulheres estão numa posição mais fragilizada, mas os homens também. O insucesso escolar é superior nos homens e cada vez mais são as mulheres que chegam ao ensino superior.

A igualdade deve começar nos jovens…

Deve começar na nossa casa. Nós condicionamos as escolhas de homens e mulheres. Começa no enxoval. As meninas têm a roupa cor-de-rosa e os meninos azul. Os meninos jogam à bola e as meninas brincam com bonecas. E porquê? São elas que vão assumir o papel de mães…

Mas em termos biológicos nunca deixarão de o ser…

Em termos biológicos há pai e mãe que devem participar de modo igualitário na educação dos filhos.

Hoje a lei já prevê que o pai tire parte da licença de paternidade. Se isso acontecesse mais as empresas deixariam de preferir homens.

Não sei se seria bem aceite pelas entidades patronais. Provavelmente não, mas é um caminho a fazer.

A mudança está para breve?

Já se deram passos importantes. Não podemos dizer que vivemos numa sociedade democrática enquanto homens e mulheres não tiverem de facto as mesmas oportunidades e direitos. Enquanto não puderem ser aquilo que são e o que querem ser nas mais variadas esferas da sua vida. Independentemente do facto de serem homens ou mulheres.

O MIRANTE
 
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