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O juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) Carlos Alexandre alertou ontem, no Porto, para a necessidade de mudança do ónus da prova nos casos de corrupção. Só assim, disse, é possível agilizar a justiça nestes casos, passando o suspeito a ter de explicar ao tribunal como obteve determinados rendimentos.
Carlos Alexandre foi ao encontro das palavras da procuradora-geral adjunta Cândida Almeida que, anteontem, havia também defendido a criação do crime de enriquecimento ilícito, como forma de combater a actual necessidade de provar a relação de causa efeito no acto corruptivo.
O magistrado participou no seminário ‘A Economia da Corrupção nas Sociedades Desenvolvidas Contemporâneas’ durante o qual traçou um quadro negro para a investigação e punição dos actos corruptos.
"O facto de em tribunal o arguido poder remeter-se ao silêncio ou ter amnésias selectivas faz com que este não possa ser confrontado com o que foi dito em inquérito e assim centenas de páginas de nada servirem", disse o magistrado.
"A minha experiência diz-me que sem alterações de fundo em matéria de valoração dos depoimento em inquérito, tarde ou nunca o combate à corrupção logrará sucesso visível", acrescentou.
O juiz do TCIC alertou para as dificuldades da recolha de prova na investigação. Na óptica do magistrado, faltam unidades especializadas no Ministério Público e na Polícia Judiciária, a que acrescem as dificuldades em recolher sons e imagens. "Não podemos trabalhar com agentes encobertos, o que em outros países se faz", referiu.
Carlos Alexandre disse ainda que a sua experiência no terreno lhe demonstrou as dificuldades na realização de buscas. "Os advogados apertam cada vez mais sobre o que se vai à procura: se de um papel ou de uma offshore. Tudo tem de estar escrito com precisão, senão ameaçam declarar o despacho nulo", afirmou.
PERFIL
Carlos Alexandre, o ‘super-juiz do Ticão’, saltou para as luzes da ribalta quando recebeu as primeiras ameaças de morte. Avesso à exposição pública, o magistrado determinou a prisão preventiva nos casos mais mediáticos. Recentemente mandou prender Oliveira e Costa. Foi também o magistrado quem determinou as buscas aos bancos, no âmbito do processo ‘Furacão’. Esteve ao lado do MP nas buscas do Freeport.
TRANSPARÊNCIA NOS NEGÓCIOS PÚBLICOS
Euclides Dâmaso, procurador--geral adjunto do DIAP de Coimbra, defendeu a pertinência de um estudo que mostre a ligação entre a corrupção e a crise financeira. Para maior controlo dos negócios públicos, o magistrado defendeu transparência. "O valor da adjudicação das obras dos grandes municípios e do Estado devem ser publicados para escrutínio. Ainda mais agora que os negócios de ajuste directo são feitos por valores tão elevados". Euclides Dâmaso alertou para a necessidade de maior controlo sobre as contas dos partidos e políticos. "O financiamento ilegal dos partidos atinge tal ponto que se põe em causa o acesso à Função Pública", disse.
PORMENORES
DENÚNCIA
O magistrado defendeu a denúncia anónima dos corruptos, "bastante necessária nos tempos que vão correndo".
ESCUTAS TELEFÓNICAS
Carlos Alexandre queixou-se das limitações criadas para as escutas telefónicas.
ENRIQUECIMENTO ILÍCITO
O juiz criticou o "acentuado pendor garantístico" da lei face aos suspeitos de "enriquecimentos súbitos" e lamentou a "diminuta" cultura de denúncia de corrupção.
João Carlos Malta