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Inspector do Trabalho ataca hipermercados

florindo

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A precariedade deu o mote ao discurso de tomada de posse. Na sua primeira entrevista, José Luís Forte admite que dar à Autoridade para as Condições no Trabalho (ACT) competências de uma polícia criminal ajudaria a combater o emprego ilegal. As grandes superfícies, transportes, pesca e metalomecânica são prioridades para 2011.

Na tomada de posse, disse que a precariedade é perversa, mas é cada vez mais usada. É uma questão de mentalidade, de modelo económico, da lei, ainda apelidada de rígida por proibir o despedimento individual sem justa causa?

É um absurdo que se diga isso. Os empresários queixam-se do que não existe. E não concordo com a alegação de que o mal das empresas resultará da subida do salário mínimo para 500 euros. Quem não puder pagar 500 euros a um trabalhador não sei se terá condições para estar no mercado.

Nesta altura de crise, que problemas tem a ACT encontrado?

O trabalho não declarado e os salários em atraso; pessoas sem contrato nem descontos, que prestam serviço subordinado e pago com recibos verdes, sujeitos a sucessivos contratos a termo quando não há nenhum dos requisitos para a existência de contrato a termo. Os trabalhadores querem é trabalho. As pequenas empresas de sectores tradicionais regrediram, passaram a entender que era possível ter pessoas por metade do ordenado ou pagar-lhes quando pode ou exigir que trabalhem mais e não pagar.

Há empresas a atravessar seríssimas dificuldades a pedir um esforço extra aos trabalhadores; e empresas que aproveitam para os explorar. Como destrinçar uma da outra?

Não há destrinça possível do ponto de vista da actuação da ACT. Não podemos actuar segundo suposições nem princípios de ordem moral ou ética. A regra tem que se aplicar e ponto final.

Até que ponto mais vale um mau trabalho do que trabalho nenhum?

Há uma campanha europeia que devemos respeitar: a do trabalho digno. Não devemos ceder à tentação de voltar ao fim do séc. XIX e considerar como benfeitores os empresários que dão trabalho a alguém.

Em Portugal o Trabalho é tratado com dignidade, quer pelos trabalhadores quer pelos empregadores?

O Trabalho tem sido maltratado por todos. Quando o trabalhador não é respeitado, tem tendência a não respeitar. Ainda não foi entendido como um direito e um dever mútuo, de respeitar e de ser respeitado. Há uma aprendizagem a fazer, um respeito mútuo a desenvolver.

A tónica costuma ser posta nos empregadores, mas que papel vê para os sindicatos, nesta matéria?

Um papel importantíssimo. O mundo sindical está a atravessar conhecidas dificuldades. A crise, contrariamente ao que se suporia, afasta os trabalhadores dos sindicatos e não será só porque têm medo de ser reconhecidos como sindicalizados. Os sindicatos não estão a aproximar-se dos trabalhadores, [devem] compreender o que é o mundo laboral hoje, não ficcionar um que não existe.

Com o reforço de pessoal em curso, a ACT tem os meios humanos e materiais de que necessita?

Tem o dever de ficar composta. Não há avanço nem número que ultrapasse a disponibilidade e a qualidade das pessoas, empenho e motivação. É esse o meu papel.

Mediante os constrangimentos orçamentais, que prioridades definiu para a ACT para 2011?

Os cortes não vão ter impacto na inspecção nem na prevenção, há muito por onde cortar, por exemplo, em comunicações ou deslocações. Haverá também uma redistribuição regional dos inspectores, a arrancar no início do ano. Há zonas do Interior onde o tecido industrial diminuiu e é natural que estejam dotados com inspectores a mais. É preciso fazer entender aos centros locais que os acessos não são os mesmos de há 20 anos. Os inspectores têm competência nacional, o facto de estarem colocados no Porto, por exemplo, não os impede de ir a Bragança, temporariamente, porque lá há uma grande obra.

Na prevenção, a construção civil continuará a concentrar esforços?

Manteremos a prevenção na construção, mas é preciso alargar a outras áreas. Há acidentes mortais em espaços fechados por inalação de gases tóxicos, vamos fazer uma campanha de prevenção. As grandes superfícies atingiram uma dimensão enorme em Portugal, mas está tudo a correr bem? Temos dos melhores centros comerciais do Mundo porque somos os mais originais e criativos? Ou porque o local de trabalho é facilitador de práticas menos "simpáticas"? Temos que ir ver o que se passa. Não se tem feito isso de forma sistemática e generalizada. Centros comerciais, supermercados, hipermercados... E verificar as condições de saúde. Por exemplo, os parques de estacionamento dos grandes centros comerciais nem sempre, estou convencido, terão as condições de qualidade do ar e ventilação necessárias. Nalguns centros comerciais de Lisboa, eu sinto-me mal e vou de passagem. Há pessoas que estão lá oito horas por dia, a trabalhar. Vamos lá na lógica da prevenção e da inspecção.

Quais as prioridades inspectivas?

A metalomecânica, os transportes rodoviário, ferroviário e marítimo. Nas pescas, a intervenção da ACT nunca existiu. Não há profissão tão perigosa quanto a do pescador, e desregulada. Há portos de pesca a Norte que são um perigo, como Esposende. Tem que ser intervencionado [pelas Obras Públicas].

Cabe à ACT garantir o cumprimento da lei, mas quando encontra trabalhadores ilegais não pode impedir que sejam mandados embora. Tem as competências necessárias?

A ACT não é um órgão judicial, detecta irregularidades, levanta coimas e cria condições para que os trabalhadores accionem os mecanismos judiciais para repor a legalidade. A única coisa que se poderia configurar na lei seria se, com a persistência na ilegalidade, se estaria ou não a cometer um crime de desobediência. Não pode assegurar a reintegração do trabalhador.

Essa capacidade seria útil para diminuir a precariedade ilegal?

Se o mecanismo existisse, tornaria mais fácil [a diminuição da precariedade] e menos usual o incumprimento. Tenho dúvidas, na configuração actual do Estado, se pode ser assim. Achamos que há um incumprimento por ilegalidade, mas a nossa decisão pode ser impugnada. Não creio que seja possível, no sistema jurídico, atribuir à ACT poder [de integrar um trabalhador].

É diferente obrigar o trabalhador a recorrer a tribunal ou forçar a firma a repor a legalidade, dando-lhe a possibilidade de recorrer de recurso.

A lei não abre essa possibilidade. Neste campo, não acho que seja necessária qualquer iniciativa. A ACT tem que fazer uma intervenção mais regular, persistir junto das empresas com comportamentos inadequados, com uma intervenção sistemática, visitas sucessivas. Não pode deixar descansadas as empresas e deve promover e salientar os bons comportamentos.

A crise piora a qualidade do emprego. Como o atalhar?

Intensificar a acção inspectiva em áreas declaradamente mal, nomeadamente junto do trabalho não declarado. Há acções que passarão a ter mais visibilidade.

Como faz a ASAE, com a qual a ACT é tantas vezes comparada?

Tenho dúvidas sobre se deveríamos ser um órgão de polícia criminal.

Pela dimensão social e humana do Trabalho, deveria ter capacidade de intervenção imediata, por exemplo, podendo constituir arguidos?

Não digo que não. Há opiniões diferentes dentro da ACT, há alguma resistência à sua "policialização", nomeadamente por parte dos inspectores, que salientam serem bastante diferentes da ASAE.

Uma das críticas feitas à ACT é que está encarregue tanto da prevenção quanto da punição, o que pode tirar força a cada uma das esferas.

Pretende-se criar sinergias entre uma e outra. Entraram há pouco 140 inspectores e o concurso está a andar para 26 técnicos de segurança e prevenção, bem como para 56, para as contraordenações. Temos que garantir que a contraordenação prossegue quando as coimas não são pagas. E são cada vez mais os empregadores que impugnam as coimas ou, simplesmente, não as pagam. Temos que garantir que, se se levantam coimas, elas são pagas.

Como é que o fazem?

Se não pagam, mandamos o processo para tribunal para que execute a dívida. Esperemos que o Ministério Público e os Tribunais de Trabalho estejam em condições de dar resposta. Não estão.

E as coimas ficam por pagar, a lei por cumprir. Por isso insisto: o que pensa sobre a alteração das competências?

E dar-lhe competências de polícia criminal? Não vejo nenhum inconveniente em que isso aconteça. Não vou pensar sozinho, consultarei entidades, nomeadamente juristas. Acho que traria vantagens. Há uma concepção paternalista do trabalho da inspecção: que os inspectores são boas pessoas prontas a ajudar, dar bons conselhos, fazer do mundo um mundo melhor... eu acho que a inspecção do trabalho é um bocadinho mais do que isso.

Fonte JN

cumps florindo
 
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