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"Toda a gente tem uma boa história para contar"

florindo

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É jornalista freelancer e gosta, sobretudo, de contar histórias. Ana Sofia Fonseca é a autora de "Histórias com gente dentro", formato de reportagem cuja segunda série está em exibição na SIC às sextas-feiras. Na calha está já uma terceira, para estrear em 2011. "Poder ajudar" e "retirar lições de vida" são os aspectos que destaca desta aventura televisiva. Ana Sofia considera que no jornalismo se vive com "medo de apresentar ideias".


Como mergulhou neste universo? Ainda estava na faculdade. E eu e uma amiga decidimos ir por conta própria para o Quénia. Sem conhecimentos ou dinheiro. Fizemos contactos com missionários para duas reportagens. Uma sobre as prostitutas imunes ao HIV e outra sobre mutilação genital feminina. Mas, curiosamente, correu bem. Chegámos cá com os trabalhos feitos, e não tínhamos coragem para os apresentar. Vendemo-los, após muitos telefonemas, à revista do "Expresso". Depois, iniciei colaborações com a revista "Grande Reportagem". E entretanto tornei-me freelancer.

Considera a reportagem o género mais nobre do jornalismo? É um género apaixonante. Basicamente, gosto de histórias.

As melhores histórias são as simples? Sentada numa esplanada, tenho a certeza de que este senhor aqui tem uma história excelente, ou de que cada ruga da senhora dos bordados conta uma história.

Tem uma espécie de radar consigo... É do hábito. Adoro ouvir pessoas. Toda a gente tem uma boa história para contar, o que é preciso é saber ouvir. As pessoas estão cada vez mais fechadas sobre si mesmas, há cada vez mais solidão. "Histórias com gente dentro" cumpre isso. Era um programa difícil à partida, por ser com anónimos e não com famosos. Há uma frase que me ficou, soa melhor em castelhano, que é "histórias extraordinárias de gente ordinária".

Foi desse pressuposto que surgiu a ideia para o formato? Sim. As coisas vão acontecendo sem que nos apercebamos muito do seu fio condutor. A rubrica "Lomofonia" ("Expresso") sendo já muito intimista, foi uma espécie de embrião para o "Histórias". Houve receptividade do Alcides Vieira, director de Informação da SIC, e avançámos.

Como é que se cria cumplicidade sem que as pessoas sintam que se está a invadir o seu espaço íntimo? Não há fórmula. Tem a ver com relações que se criam, não se aprende na escola. Depende do que pomos de nós na conversa.

De que forma surge o tema para cada programa? Qual é o processo? É muito intuitivo. No caso desta série, sabia que queria fazer "A família", "O meu amor". No fundo, as ideias para os temas são fáceis. Depois começo a fazer listas gigantes de possíveis histórias. Um jornalista quando sai para fazer uma reportagem, deve sempre regressar com duas. O tio João de "A família" conhecemo-lo assim. Outras são construídas de raiz. Por exemplo, para "A saudade", pensei quem seria a pessoa que mais vezes a escreve. Não é o poeta, mas o homem que escreve as lápides dos cemitérios. Partimos em busca também de uma pessoa que se chamasse Saudade. E após muitos de contactos, encontrámos a Saudade, que ainda por cima se chama Saudade Pena. Diz que tem um nome triste, mas é a senhora mais alegre do mundo.

Qual a história que mais a marcou? Desta série, a de um senhor que ficou toxicodependente na tentativa de tirar dois filhos da toxicodependência. É forte. Ele disse-me que não queria falar. Fomos na mesma. E às tantas, falou. Quase não tive de lhe fazer perguntas. Outro aspecto interessante do programa é que ele é feito de Norte a Sul, reflectindo todas as diferenças que cabem em Portugal.

É complicado criar distanciamento depois de se ter emocionado? Sou jornalista. Tem de haver uma fronteira. Há uma grande dose de subjectividade, mas as histórias são as verdadeiras. Nada é romanceado. O jornalista é invisível e os entrevistados, os protagonistas.

Faz falta jornalismo de proximidade? Sim. É importante reportagem, contar histórias. Dou o exemplo da escrita, pois é o que mais gosto de fazer, até porque a televisão foi uma surpresa, nunca pensei.

Mas os leitores têm tempo para ler reportagens? Há a teria de que não têm. Eu não concordo. É óbvio que o jornalismo está a mudar. Outras plataformas têm muita expressão e força, os jornais têm de se readaptar...

Apostar mais em reportagem é um esforço que deveria ser feito? Sim, em investigação. Aprofundar mais as notícias, elaborar os temas. As pessoas gostam de ler histórias bem contadas.

Ler exige monofuncionalidade, enquanto que a reportagem na TV não... Pois, mas acredito que as pessoas gostam de ler. Se olharmos para os cafés, são muitas as que estão a ler. As histórias não se medem aos caracteres. E mesmo em televisão, está provado que as pessoas gostam de reportagem. "Histórias com gente dentro" tem tido uma boa adesão mesmo ao competir com novelas e "reality shows".

JN
 
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