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Uma vida de mentiras, segredos e crimes

florindo

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Uma vida de mentiras, segredos e crimes


Há meses que Francisco Esperança frequentava um centro espirita, em Sines. As sessões pareciam ter um efeito calmante. «Vem de lá mais aliviado» – comentava a mulher com as amigas.

Resgatar o marido do vício do álcool foi a ideia que ocupou os derradeiros pensamentos de Benvinda.

«'Tenho de tratar do meu Esperança'...», confidenciou várias vezes a uma das suas melhores amigas. A filha também andava preocupada.

Nos últimos dias, Cátia chegou a procurar uma clínica de reabilitação, em Lisboa.

«Ele piorou muito desde que a filha se tentou suicidar. Andava apático, com o olhar fixo no infinito», conta ao SOL outra amiga da família.

Na semana passada, o descontrolo do ex-bancário, de 59 anos, agora em prisão preventiva, atingiu o auge. Assassina à catanada a mulher, a filha e a neta, de apenas quatro anos. Um acumular de «dívidas» foi a justificação que deu à Polícia.

Queria poupá-las à miséria. A verdade é que, para a Judiciária, esta versão não é conclusiva.

Admitindo um cenário de delírio psicótico, os investigadores acreditam que algum outro acontecimento levou o homem a investir com tanta brutalidade contra a família, inclusive a neta.

A verdadeira paternidade da criança, que completaria este mês cinco anos, é um dos mistérios que veio à tona com este crime.

O SOL sabe que, perante as suspeitas entretanto levantadas de uma relação incestuosa entre Francisco e a filha, as autoridades vão avançar com testes de ADN para averiguar a paternidade de Maria.

Familiares e amigos da família recusam, porém, acreditar na tese de incesto, mas nunca souberam quem era o pai da criança.

Em Beja, chegou a pensar-se que seria Tomás, um jovem que Cátia conheceu em Lisboa (trabalhava na altura na corticeira Amorim) e com quem namorava quando ficou grávida, durante umas férias em Monte Gordo.

Mas nesse Verão de 2006, a jovem foi vista com vários rapazes. «Ela até quis abortar, mas ele insistiu em ter a criança, a quem chamavam Maria Tomás», recorda uma amiga.

Em Fevereiro de 2007 nasce Maria e passado algum tempo o casal muda-se para Lisboa.

Mas algo altera a atitude de Tomás, que começa a desconfiar não ser ele o pai. Um teste de paternidade terá confirmado as suspeitas e, desiludido, Tomás afastou-se de vez. A bebé ainda não teria um ano.

A verdade é que a família Esperança mantinha a versão de que era ele o progenitor e que, mesmo ausente, continuava a pagar a pensão de alimentos.

Quando começou a falar, Maria perguntava pelo pai e as respostas variavam. «Diziam que estava doente, que tinha ido para Angola...»

Cátia ainda volta para Lisboa, sozinha com a menina, aluga uma casa e consegue um contrato de trabalho temporário na Cetelem.

Mas a empresa não renova o vínculo e ela é obrigada a voltar a Beja, para casa dos pais.

Já na pacata cidade arranjou emprego, primeiro numa loja de decoração e depois numa ourivesaria.

Mais tarde vai trabalhar para uma seguradora, onde é apanhada a desviar cerca de seis mil euros.

Desnorteada, tenta suicidar-se, atirando-se da janela do 2.º andar da moradia da família. Esteve em risco de ficar tetraplégica, mas recuperou e só tinha problemas na coluna.

Há muito que Cátia vivia num mundo de ilusão e mentira: sempre que era apresentada a alguém, a jovem, de 28 anos, fingia pertencer a famílias ricas. «Chegava a dizer que era uma Champalimaud e que tinha muitos bens, como iates», recordam colegas.

Os pais, garantem, eram em parte responsáveis por esta faceta. «Quando tinha sete anos, o pai estava fugido da polícia e durante um período esteve escondido na própria casa.

Ela teve de protegê-lo e não podia contar a ninguém», diz outra amiga, recordando também uma miúda de hábitos normais: «Tomava café com os amigos, lia, desenhava e gostava de arte».

Agora, o objectivo de Cátia era estudar na área de Saúde, depois de ter abandonado o curso de arquitectura, em 2003, na Lusófona, e mais recentemente um de Artes Decorativas, em Beja.

O pai era um dos seus maiores aliados e confidente (foi ele quem pagou os seis mil euros do desfalque da filha e a tirou da prisão quando esteve detida por conduzir com uma carta de condução falsa).

Dias antes do triplo homicídio, viram-nos a passear no centro da cidade.

«Estavam nas Portas de Mértola: ele, carinhoso como sempre, ajudava-a a andar nas canadianas», contam os habitantes.

Cancro estaria controlado

Francisco, que é filho único já não tem pais, esteve no Ultramar – terá sido aí que adquiriu a catana com que esfaqueou a família.

Segundo os vizinhos, era um homem culto – na cadeia, onde este preso por desviar dinheiro do Crédito Predial Português, chegou a tirar o curso de Direito, mas nunca exerceu.

E escrevia poemas a Benvinda, que conheceu na Escola Industrial de Beja.

Quando saiu da prisão, investiu na expansão da loja de lingerie (Mini-Meia) que a mulher abriu há 20 anos.

A secção de homem estava a cargo dele, mas acabou por fechar por falta de clientela. Francisco passou a ficar encarregado da contabilidade do estabelecimento.

Entretanto, o vício do álcool agrava-se, o que coincide com a tentativa de suicídio da filha e com a notícia de que ele tem um cancro nos intestinos.

Doença que estaria controlada, depois de ter sido operado duas vezes e ter feito quimioterapia.

Mas, segundo contou à Polícia, não foi nada disto que o levou a matar a família. «Foram as dívidas», insiste. Uma versão que não convence os vizinhos: «É verdade que tinham dívidas a fornecedores, mas a loja facturava».

A certeza ninguém tem. Até porque Benvinda, uma mulher de origens humildes que subiu a pulso, era mestre em manter as aparências e proteger a imagem do marido e da filha.

Talvez por isso tenha negado sempre a tentativa de suicídio de Cátia e dado cobertura à falsa história sobre Tomás.

Mas não só: aceitou divorciar-se do marido quando foi preso só para salvar o património da família que ficou em seu nome.

Quem a conhecia garante que era ambiciosa e o ganha-pão da família. «E também tinha a mania das grandezas», lembram os amigos, recordando que nos últimos tempos Benvinda andava mais nervosa: «E fumava muito».

Passava os dias a vigiar o marido, preocupada com as escapadelas para o café.

Nos últimos tempos, a família Esperança teve também de desenterrar a velha questão da paternidade de Maria : o novo namorado de Cátia, Pedro, queria casar com ela, mas exigia saber quem era o pai da criança.

Foi este motorista da Carris, que conheceu Cátia no Hospital de São José em Lisboa – «Foi amor á primeira vista», contam os amigos.

Avisou a Polícia por não saber da namorada há vários dias.

Primeiro fez queixa em Lisboa, mas os agentes terão acreditado na mentira de Francisco, que alegava estarem fora em casa de familiares, embora os cadáveres estivessem já escondidos na moradia.

Só quando Pedro foi a Beja e começou a rondar a vivenda percebeu que algo não estava bem: foi aí que a PSP de Beja cercou a casa.

Ao fim de três horas, e depois de ter disparado um tiro, Francisco, bêbedo e em tronco nu, abre a porta e rende-se.


SOL
 
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