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[h=2]Tribunal da Relação de Guimarães, Acórdão de 25 Set. 2017, Processo 863/06[/h]Relator: Pedro Miguel Bengala Reis da Cunha Lopes.
Devem englobar também como garantias reais os bens onerados que possibilitem ainda o pagamento das custas ou multa em falta
MULTA. BENS DESEMBARAÇADOS. Quando o prazo para o pagamento da multa ou de alguma das suas prestações tenha terminado sem ser cumprido, procede-se à execução patrimonial dos bens suficientes e desembaraçados do condenado. No exposto, foi aplicada ao condenado a pena de 250 dias de multa, à taxa diária de 3 euros, num total de 750 euros, requerendo este o pagamento da aludida multa em prestações que lhe foi indevido pela inexistência de bens penhoráveis e pelo não pagamento da mesma de forma voluntária. In casu, deve-se entender que os bens desembaraçados devem englobar também os bens onerados com garantias reais, mas que ainda é possível o pagamento das custas e/ou multa em falta, pelo que tendo o condenado casa própria, ainda que onerada, deve-se improceder a fixação de prisão subsidiária, porque não está esgotada a possibilidade de cobrança coerciva do bem.
Disposições aplicadas
DL n.º 400/82, de 23 de Setembro (Código Penal) art. 49.1; art. 491.2
Texto
1 - A prisão subsidiária pressupõe a impossibilidade de cobrança coerciva da multa.2 - A expressão "bens desembaraçados" constante do art.º 491º/2 C.P.P. deve ser lida em harmonia com o disposto no art.º 35º/4 R.C.P., que fala em quaisquer bens, no sentido de ser proposta Execução para o pagamento da multa.3 - Assim, por "bens desembaraçados" devem entender-se ainda os bens onerados por garantias reais (por exemplo, a hipoteca), mas que ainda é possível proporcionarem o pagamento da multa em falta.4 - A informação sobre bens que determina o M.P. a não instaurar Execução deve ter um conteúdo atualizado.
[h=3]1 - Relatório[/h]Por despacho proferido nestes autos em 2 de Novembro de 2 016, foi ao arguido M. C. fixada pena de prisão subsidiária, dado o não pagamento da pena principal, de multa - fls. 46.
Não concordando com a decisão proferida neste despacho, dela interpôs recurso, que subiu em separado, o arguido M. C..
Por despacho de fls. 96 foi determinado o cumprimento do disposto nos arts.º 107º-A, C.P.P. e 139º/5 C.P.C., por se entender que o recurso dera entrada um dia útil depois do prazo, em 13 de Dezembro de 2 016.
Tal foi cumprido (fls. 97/98 destes autos de Recurso em Separado), não tendo o arguido efetuado o respetivo pagamento (fls. 111).
Decorre agora e porém de fls. 112, que o recurso apresentado, não obstante ter o carimbo de entrada de 13/12/2 016, deu entrada no Tribunal "a quo" ainda no dia 12/12/2 016.
Do que decorre que a interposição foi ainda tempestiva, não havendo pois qualquer multa a pagar.
Assim e não obstante a ausência de pagamento, analisar-se-á ainda o mesmo.
Neste, são as seguintes as conclusões apresentadas:
"1.ª Por erro de interpretação e de não aplicação da disposição legal n.[SUP]o[/SUP] 1do artigo 49.° do Código penal, o Ex.mo Sr. Juiz a quo, deveria ter instaurado previamente execução patrimonial nos termos e para os efeitos do artigo 491.°, n.[SUP]o[/SUP] 1 do Código de Processo Penal, não deveria ter baseado a douta decisão em informação constante dos autos desactualizada, para que a coercibilidade fosse aferida e determinada.
2.ª Deveria ser do entendimento do Ex.mo Sr. Juíz "a quo" ter procedido à prévia notificação do arguido e audição do mesmo, o qual teria oportunidade de expor as suas razões de facto e de direito pela impossibilidade no cumprimento, ressalvando e cumprindo o princípio básico de audíção e defesa e do contraditório.
3.ª Por último tudo ponderado, deveria o Douto Despacho recorrido ter sido proferido após audição do recorrente, nos termos conjugados da alínea b) do n.[SUP]o[/SUP] 1 do artigo 61° do Código de Processo Penal e números 1 e 5 do artigo 32.°da Constituição da República Portuguesa, pelo que por erro de interpretação e de não aplicação dos citados preceitos legais, deve ser revogado.
Termos em que, concedendo provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-se por decisão que determine a prévia instauração da respectiva execução patrimonial e que determine a prévia audição do arguido."
Ainda em 1ª instância, contrapôs o M.P. que o recorrente não tinha bens exequíveis e que a promoção do M.P. sobre s substituição da pena de multa por pena subsidiária de prisão foi notificada ao arguido (pessoalmente e na pessoa da sua Il. Defensora), com o que ficou cumprido o contraditório.
Já neste Tribunal da Relação, o Dignm.º Procurador Geral Adjunto proferiu parecer no sentido da procedência do recurso, quer no sentido de apurar atualmente dos bens do arguido, quer, na negativa, determinando a sua audição pessoal.
Notificado nos termos do disposto no art.º 417º/2 C.P.P., o arguido nada disse.
Os autos vão ser julgados em conferência, como dispõe o art.º 419º/3, b), C.P.P.
[h=3]2 - Fundamentação[/h]Para uma melhor perceção do caso em análise, proceder-se-á de seguida à transcrição integral do despacho recorrido.
"Fls. 1654: Por acórdão de fis. 989 e ss, confirmado pelo acórdão do TRG de fis. 1301 e ss., M. C. foi condenado na pena de 250 dias de multa, à taxa diária de € 3,00, num total de € 750
pela comissão, em concurso efectivo, de dois crimes de ofensa à integridade física, um qualificado outro simples, p. e p., respectivamente, pelos arts. 143°, n.[SUP]o[/SUP]1, 146°, n.[SUP]o[/SUP]1 e 2, e 132°, n.[SUP]o[/SUP]2, ai. g), e 143°, n.[SUP]o[/SUP]1, do CP.
Tal decisão foi notificada ao condenado, como se afere de fis. 1335.
O condenado, além do mais, requereu o pagamento da aludida multa em prestações, o que lhe foi indeferido por decisão de fis. 1667, da qual o mesmo interpôs recurso que foi julgado improcedente por acórdão constante de fis. 139 e ss. do apenso A.
Não são conhecidos bens penhoráveis ao condenado - cfr. fis. 1653.
Assim, tendo presente o disposto no art. 49°, n.[SUP]o[/SUP]1 e 2, do CP, determino que o condenado cumpra 166 dias de prisão subsidiária, conforme promovido a fis. 1654.
Notifique, sendo o condenado também na pessoa do seu Defensor.
Após trânsito, remeta boletins e conclua, para emissão de mandados."
2.1. - Questões a Resolver
a) Da Possibilidade de Cobrança Coerciva da Multa
2.2. - Da Possibilidade de Cobrança Coerciva da Multa
Como se referiu no despacho recorrido, a aplicação da pena substitutiva de prisão decorreu da impossibilidade de cobrança coerciva da multa, por inexistência de bens penhoráveis - sendo certo que a mesma não foi paga voluntariamente.
E, com efeito, o art.º 49º/1 C.P. faz depender a conversão da pena de multa principal em pena de prisão subsidiária, da ausência de pagamento da mesma, voluntário ou coercivo.
Como dispõe o art.º 35º/4 R.C.P., o M.P. instaura execução por custas ou multa, quando sejam conhecidos bens penhoráveis do devedor que se afigurem suficientes face ao valor da execução, abstendo-se de a instaurar quando a dívida seja de montante inferior aos custos da atividade e às despesas prováveis da execução. Este regime é o mesmo que decorria já dos anteriores Códigos das Custas Judiciais (cfr. art.º 116º/1 e n.[SUP]o[/SUP] 2), D.L. n.[SUP]o[/SUP] 224-A/96, 26/11, atualizado em 2 004, tal como anteriormente constava do art.º 202º/2 do mesmo D.L.).
Também importante para o caso, o art.º 491º/2 C.P.P. - inserido na parte da execução das penas não privativas de liberdade - que dispõe no sentido de que "tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados (...) o M.P. promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas.
Também este normativo vem da redação inicial do C.P.P. (D.L. n.[SUP]o[/SUP] 78/87, 17/2).
O que quer dizer que estes dois normativos, com previsões normativas não totalmente idênticas, coexistem pelo menos desde 1 987.
Questão que se põe, é a de nas leis de custas se referir que quaisquer bens do condenado são executáveis, enquanto no C.P.P. se fala apenas de "bens desembaraçados". O que é relevante no caso dos autos, pois da informação policial sobre bens consta que o condenado M. C. tem casa própria, mas adquirida por recurso ao crédito bancário (fls. 104/105). Da mesma consta ainda que estará Desempregado e não lhe são conhecidos bens móveis.
O M.P. promove então que se apure se o mesmo tem veículo automóvel (fls. 106), resultando de fls. 107 não ser titular de qualquer veículo. Então, a fls. 108 destes autos de Recurso, o M.P. não vendo viabilidade na Execução, promove a aplicação da correspondente pena de prisão subsidiária.
Problema que se coloca é o de saber se a sua casa não poderá ser penhorada, apesar de muito provavelmente estar onerada por garantia real, no caso a hipoteca - a informação policial só fala da existência de um contrato de mútuo, com um banco.
E, de facto, aqui a redação da lei de custas e a do Código de Processo Penal parecem diferentes, já que na primeira se refere qualquer bem e no segundo apenas "bens desembaraçados".
O que tem a ver com a real compreensão desta expressão.
Ela está naturalmente ligada à inexistência de garantias reais e à livre disponibilidade dos direitos reais correspondentes. Mas, a ser só isto, como explicar a existência, há tantos anos, dos referidos normativos de custas e de Processo Penal, entre si incompatíveis? Basta que sobre um bem exista uma garantia real, por hipótese uma hipoteca registada, para que esse bem passe a ser impenhorável, para efeitos de custas e multa? Para mais, com o que daí decorre, nomeadamente a possibilidade de ser aplicada uma pena de prisão subsidiária?
Sob pena de se instalar o absurdo e de não se saber qual dos preceitos seguir, já que o seu âmbito de aplicação é idêntico, parece que dos mesmos se deve fazer uma leitura harmoniosa, caso possível.
Evidente é, que um crédito hipotecário ficará em primeiro lugar na sentença de graduação de créditos; mas isso não torna o respetivo direito impenhorável por terceiros. O que daí decorre é que o crédito que legitima a Execução ficará em 2º lugar ou atrás do último crédito hipotecário, quando for de proceder ao pagamento pelo produto da venda dos bens penhorados.
E, aí das duas uma: ou do produto da venda resultou dinheiro para o pagamento de todos os créditos ou não, não sendo pago o crédito exequendo.
Ora, só neste último caso não deve ser proposta Execução, pois que da atuação do Tribunal não tirará o Estado qualquer benefício. O conceito de "bem desembaraçado" deve pois ser melhor compreendido, no sentido de englobar ainda os bens onerados com garantias reais, mas em que ainda é possível o pagamento das custas e/ou multa em falta. O que tem naturalmente a ver com o valor do direito a penhorar e o valor do crédito protegido com a garantia real; se o primeiro for superior ao segundo, de tal forma que permita ainda o pagamento das custas e multa em falta, então deve ser proposta Execução.
E, caso o M.P. não o queira fazer, deve então improceder a fixação de prisão subsidiária, porque não esgotadfa a possibilidade de cobrança coerciva do bem (art.º 49º/1 C.P.).
Assim e por "bem desembaraçado" deve entender-se bem que permita ainda o pagamento das custas e/ou multa. Com o que ficam harmonizadas a lei de custas e o Código de Processo Penal.
No caso dos autos, acresce que a informação sobre bens deu entrada em Tribunal em 12/5/2 015 (fls. 107) e o despacho recorrido é de 2/11/2 016 (fls. 46) ou seja, entre os mesmos há uma dilação de cerca de 1 (um) ano e 6 (seis) meses. O que a torna desatualizada, mesmo à data em que foi proferido o despacho recorrido.
Pelo que e no caso dos autos, importa:
- pedir nova informação sobre bens;
- obter informação sobre o valor da propriedade do condenado, nomeadamente através de avaliação sumária:
- obter confirmação sobre se existe hipoteca ou outro direito real de garantia, que onere tal propriedade;
- na afirmativa, obter informação sobre o valor assegurado por esse direito real de garantia, nomeadamente através da respetiva entidade bancária.
Procede pois nesta parte, o recurso interposto.
Com esta decisão fica prejudicada a questão de saber se o exercício do contraditório com o condenado, necessário à fixação de prisão subsidiária, pode ser exercido por escrito ou deve ser assumido presencialmente, desde já se consignando que existe Jurisprudência atual, num e noutro sentido. Com efeito, aquela questão sobre a possibilidade de cobrança coerciva é anterior a esta e, caso seja possível a execução, esta deixa de ter sentido.
**
Termos em que,
[h=3]3 - Decisão[/h]a) se julga procedente o recurso interposto pelo condenado M. C. e, por via disso, altera-se a decisão recorrida, no sentido de serem obtidas as seguintes informações:
- nova informação sobre bens;
- informação sobre o valor da propriedade do condenado, nomeadamente através de avaliação sumária:
- confirmação sobre se existe hipoteca ou outro direito real de garantia, que onere tal propriedade;
- na afirmativa, obter informação sobre o valor assegurado por esse direito real de garantia com relação ao valor atual em dívida, nomeadamente através da respetiva entidade bancária.
b) Por prejudicada, não se conhece da questão de o arguido ter de ser ouvido presencialmente ou apenas por escrito, antes da fixação da pena de prisão subsidiária.
c) Sem custas.
d) Notifique.
(Pedro Cunha Lopes)
(Fátima Bernardes)
Devem englobar também como garantias reais os bens onerados que possibilitem ainda o pagamento das custas ou multa em falta
MULTA. BENS DESEMBARAÇADOS. Quando o prazo para o pagamento da multa ou de alguma das suas prestações tenha terminado sem ser cumprido, procede-se à execução patrimonial dos bens suficientes e desembaraçados do condenado. No exposto, foi aplicada ao condenado a pena de 250 dias de multa, à taxa diária de 3 euros, num total de 750 euros, requerendo este o pagamento da aludida multa em prestações que lhe foi indevido pela inexistência de bens penhoráveis e pelo não pagamento da mesma de forma voluntária. In casu, deve-se entender que os bens desembaraçados devem englobar também os bens onerados com garantias reais, mas que ainda é possível o pagamento das custas e/ou multa em falta, pelo que tendo o condenado casa própria, ainda que onerada, deve-se improceder a fixação de prisão subsidiária, porque não está esgotada a possibilidade de cobrança coerciva do bem.
Disposições aplicadas
DL n.º 400/82, de 23 de Setembro (Código Penal) art. 49.1; art. 491.2
Texto
1 - A prisão subsidiária pressupõe a impossibilidade de cobrança coerciva da multa.2 - A expressão "bens desembaraçados" constante do art.º 491º/2 C.P.P. deve ser lida em harmonia com o disposto no art.º 35º/4 R.C.P., que fala em quaisquer bens, no sentido de ser proposta Execução para o pagamento da multa.3 - Assim, por "bens desembaraçados" devem entender-se ainda os bens onerados por garantias reais (por exemplo, a hipoteca), mas que ainda é possível proporcionarem o pagamento da multa em falta.4 - A informação sobre bens que determina o M.P. a não instaurar Execução deve ter um conteúdo atualizado.
[h=3]1 - Relatório[/h]Por despacho proferido nestes autos em 2 de Novembro de 2 016, foi ao arguido M. C. fixada pena de prisão subsidiária, dado o não pagamento da pena principal, de multa - fls. 46.
Não concordando com a decisão proferida neste despacho, dela interpôs recurso, que subiu em separado, o arguido M. C..
Por despacho de fls. 96 foi determinado o cumprimento do disposto nos arts.º 107º-A, C.P.P. e 139º/5 C.P.C., por se entender que o recurso dera entrada um dia útil depois do prazo, em 13 de Dezembro de 2 016.
Tal foi cumprido (fls. 97/98 destes autos de Recurso em Separado), não tendo o arguido efetuado o respetivo pagamento (fls. 111).
Decorre agora e porém de fls. 112, que o recurso apresentado, não obstante ter o carimbo de entrada de 13/12/2 016, deu entrada no Tribunal "a quo" ainda no dia 12/12/2 016.
Do que decorre que a interposição foi ainda tempestiva, não havendo pois qualquer multa a pagar.
Assim e não obstante a ausência de pagamento, analisar-se-á ainda o mesmo.
Neste, são as seguintes as conclusões apresentadas:
"1.ª Por erro de interpretação e de não aplicação da disposição legal n.[SUP]o[/SUP] 1do artigo 49.° do Código penal, o Ex.mo Sr. Juiz a quo, deveria ter instaurado previamente execução patrimonial nos termos e para os efeitos do artigo 491.°, n.[SUP]o[/SUP] 1 do Código de Processo Penal, não deveria ter baseado a douta decisão em informação constante dos autos desactualizada, para que a coercibilidade fosse aferida e determinada.
2.ª Deveria ser do entendimento do Ex.mo Sr. Juíz "a quo" ter procedido à prévia notificação do arguido e audição do mesmo, o qual teria oportunidade de expor as suas razões de facto e de direito pela impossibilidade no cumprimento, ressalvando e cumprindo o princípio básico de audíção e defesa e do contraditório.
3.ª Por último tudo ponderado, deveria o Douto Despacho recorrido ter sido proferido após audição do recorrente, nos termos conjugados da alínea b) do n.[SUP]o[/SUP] 1 do artigo 61° do Código de Processo Penal e números 1 e 5 do artigo 32.°da Constituição da República Portuguesa, pelo que por erro de interpretação e de não aplicação dos citados preceitos legais, deve ser revogado.
Termos em que, concedendo provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, substituindo-se por decisão que determine a prévia instauração da respectiva execução patrimonial e que determine a prévia audição do arguido."
Ainda em 1ª instância, contrapôs o M.P. que o recorrente não tinha bens exequíveis e que a promoção do M.P. sobre s substituição da pena de multa por pena subsidiária de prisão foi notificada ao arguido (pessoalmente e na pessoa da sua Il. Defensora), com o que ficou cumprido o contraditório.
Já neste Tribunal da Relação, o Dignm.º Procurador Geral Adjunto proferiu parecer no sentido da procedência do recurso, quer no sentido de apurar atualmente dos bens do arguido, quer, na negativa, determinando a sua audição pessoal.
Notificado nos termos do disposto no art.º 417º/2 C.P.P., o arguido nada disse.
Os autos vão ser julgados em conferência, como dispõe o art.º 419º/3, b), C.P.P.
[h=3]2 - Fundamentação[/h]Para uma melhor perceção do caso em análise, proceder-se-á de seguida à transcrição integral do despacho recorrido.
"Fls. 1654: Por acórdão de fis. 989 e ss, confirmado pelo acórdão do TRG de fis. 1301 e ss., M. C. foi condenado na pena de 250 dias de multa, à taxa diária de € 3,00, num total de € 750
pela comissão, em concurso efectivo, de dois crimes de ofensa à integridade física, um qualificado outro simples, p. e p., respectivamente, pelos arts. 143°, n.[SUP]o[/SUP]1, 146°, n.[SUP]o[/SUP]1 e 2, e 132°, n.[SUP]o[/SUP]2, ai. g), e 143°, n.[SUP]o[/SUP]1, do CP.
Tal decisão foi notificada ao condenado, como se afere de fis. 1335.
O condenado, além do mais, requereu o pagamento da aludida multa em prestações, o que lhe foi indeferido por decisão de fis. 1667, da qual o mesmo interpôs recurso que foi julgado improcedente por acórdão constante de fis. 139 e ss. do apenso A.
Não são conhecidos bens penhoráveis ao condenado - cfr. fis. 1653.
Assim, tendo presente o disposto no art. 49°, n.[SUP]o[/SUP]1 e 2, do CP, determino que o condenado cumpra 166 dias de prisão subsidiária, conforme promovido a fis. 1654.
Notifique, sendo o condenado também na pessoa do seu Defensor.
Após trânsito, remeta boletins e conclua, para emissão de mandados."
2.1. - Questões a Resolver
a) Da Possibilidade de Cobrança Coerciva da Multa
2.2. - Da Possibilidade de Cobrança Coerciva da Multa
Como se referiu no despacho recorrido, a aplicação da pena substitutiva de prisão decorreu da impossibilidade de cobrança coerciva da multa, por inexistência de bens penhoráveis - sendo certo que a mesma não foi paga voluntariamente.
E, com efeito, o art.º 49º/1 C.P. faz depender a conversão da pena de multa principal em pena de prisão subsidiária, da ausência de pagamento da mesma, voluntário ou coercivo.
Como dispõe o art.º 35º/4 R.C.P., o M.P. instaura execução por custas ou multa, quando sejam conhecidos bens penhoráveis do devedor que se afigurem suficientes face ao valor da execução, abstendo-se de a instaurar quando a dívida seja de montante inferior aos custos da atividade e às despesas prováveis da execução. Este regime é o mesmo que decorria já dos anteriores Códigos das Custas Judiciais (cfr. art.º 116º/1 e n.[SUP]o[/SUP] 2), D.L. n.[SUP]o[/SUP] 224-A/96, 26/11, atualizado em 2 004, tal como anteriormente constava do art.º 202º/2 do mesmo D.L.).
Também importante para o caso, o art.º 491º/2 C.P.P. - inserido na parte da execução das penas não privativas de liberdade - que dispõe no sentido de que "tendo o condenado bens suficientes e desembaraçados (...) o M.P. promove logo a execução, que segue os termos da execução por custas.
Também este normativo vem da redação inicial do C.P.P. (D.L. n.[SUP]o[/SUP] 78/87, 17/2).
O que quer dizer que estes dois normativos, com previsões normativas não totalmente idênticas, coexistem pelo menos desde 1 987.
Questão que se põe, é a de nas leis de custas se referir que quaisquer bens do condenado são executáveis, enquanto no C.P.P. se fala apenas de "bens desembaraçados". O que é relevante no caso dos autos, pois da informação policial sobre bens consta que o condenado M. C. tem casa própria, mas adquirida por recurso ao crédito bancário (fls. 104/105). Da mesma consta ainda que estará Desempregado e não lhe são conhecidos bens móveis.
O M.P. promove então que se apure se o mesmo tem veículo automóvel (fls. 106), resultando de fls. 107 não ser titular de qualquer veículo. Então, a fls. 108 destes autos de Recurso, o M.P. não vendo viabilidade na Execução, promove a aplicação da correspondente pena de prisão subsidiária.
Problema que se coloca é o de saber se a sua casa não poderá ser penhorada, apesar de muito provavelmente estar onerada por garantia real, no caso a hipoteca - a informação policial só fala da existência de um contrato de mútuo, com um banco.
E, de facto, aqui a redação da lei de custas e a do Código de Processo Penal parecem diferentes, já que na primeira se refere qualquer bem e no segundo apenas "bens desembaraçados".
O que tem a ver com a real compreensão desta expressão.
Ela está naturalmente ligada à inexistência de garantias reais e à livre disponibilidade dos direitos reais correspondentes. Mas, a ser só isto, como explicar a existência, há tantos anos, dos referidos normativos de custas e de Processo Penal, entre si incompatíveis? Basta que sobre um bem exista uma garantia real, por hipótese uma hipoteca registada, para que esse bem passe a ser impenhorável, para efeitos de custas e multa? Para mais, com o que daí decorre, nomeadamente a possibilidade de ser aplicada uma pena de prisão subsidiária?
Sob pena de se instalar o absurdo e de não se saber qual dos preceitos seguir, já que o seu âmbito de aplicação é idêntico, parece que dos mesmos se deve fazer uma leitura harmoniosa, caso possível.
Evidente é, que um crédito hipotecário ficará em primeiro lugar na sentença de graduação de créditos; mas isso não torna o respetivo direito impenhorável por terceiros. O que daí decorre é que o crédito que legitima a Execução ficará em 2º lugar ou atrás do último crédito hipotecário, quando for de proceder ao pagamento pelo produto da venda dos bens penhorados.
E, aí das duas uma: ou do produto da venda resultou dinheiro para o pagamento de todos os créditos ou não, não sendo pago o crédito exequendo.
Ora, só neste último caso não deve ser proposta Execução, pois que da atuação do Tribunal não tirará o Estado qualquer benefício. O conceito de "bem desembaraçado" deve pois ser melhor compreendido, no sentido de englobar ainda os bens onerados com garantias reais, mas em que ainda é possível o pagamento das custas e/ou multa em falta. O que tem naturalmente a ver com o valor do direito a penhorar e o valor do crédito protegido com a garantia real; se o primeiro for superior ao segundo, de tal forma que permita ainda o pagamento das custas e multa em falta, então deve ser proposta Execução.
E, caso o M.P. não o queira fazer, deve então improceder a fixação de prisão subsidiária, porque não esgotadfa a possibilidade de cobrança coerciva do bem (art.º 49º/1 C.P.).
Assim e por "bem desembaraçado" deve entender-se bem que permita ainda o pagamento das custas e/ou multa. Com o que ficam harmonizadas a lei de custas e o Código de Processo Penal.
No caso dos autos, acresce que a informação sobre bens deu entrada em Tribunal em 12/5/2 015 (fls. 107) e o despacho recorrido é de 2/11/2 016 (fls. 46) ou seja, entre os mesmos há uma dilação de cerca de 1 (um) ano e 6 (seis) meses. O que a torna desatualizada, mesmo à data em que foi proferido o despacho recorrido.
Pelo que e no caso dos autos, importa:
- pedir nova informação sobre bens;
- obter informação sobre o valor da propriedade do condenado, nomeadamente através de avaliação sumária:
- obter confirmação sobre se existe hipoteca ou outro direito real de garantia, que onere tal propriedade;
- na afirmativa, obter informação sobre o valor assegurado por esse direito real de garantia, nomeadamente através da respetiva entidade bancária.
Procede pois nesta parte, o recurso interposto.
Com esta decisão fica prejudicada a questão de saber se o exercício do contraditório com o condenado, necessário à fixação de prisão subsidiária, pode ser exercido por escrito ou deve ser assumido presencialmente, desde já se consignando que existe Jurisprudência atual, num e noutro sentido. Com efeito, aquela questão sobre a possibilidade de cobrança coerciva é anterior a esta e, caso seja possível a execução, esta deixa de ter sentido.
**
Termos em que,
[h=3]3 - Decisão[/h]a) se julga procedente o recurso interposto pelo condenado M. C. e, por via disso, altera-se a decisão recorrida, no sentido de serem obtidas as seguintes informações:
- nova informação sobre bens;
- informação sobre o valor da propriedade do condenado, nomeadamente através de avaliação sumária:
- confirmação sobre se existe hipoteca ou outro direito real de garantia, que onere tal propriedade;
- na afirmativa, obter informação sobre o valor assegurado por esse direito real de garantia com relação ao valor atual em dívida, nomeadamente através da respetiva entidade bancária.
b) Por prejudicada, não se conhece da questão de o arguido ter de ser ouvido presencialmente ou apenas por escrito, antes da fixação da pena de prisão subsidiária.
c) Sem custas.
d) Notifique.
(Pedro Cunha Lopes)
(Fátima Bernardes)