O que mudou no WRC em 38 anos
Muito se tem falado nos últimos tempos de possíveis alterações no Mundial de Ralis, com os adeptos a aguardarem que a vontade, expressa em diversas entrevistas, do Presidente da FIA e de Michéle Mouton, nova manager do WRC, em fazer regressar os ralis aos formatos da sua época dourada, os anos oitenta, vá em frente.
Não é fácil saber com exatidão, nesta conjuntura, que medidas são acertadas ou demasiado arriscadas, e na história do WRC há muitos exemplos disso mesmo. Os tempos são diferentes, o contexto económico também, e por isso há que dar passos seguros, sob pena de novo retrocesso.
A nova geração de WRCs parece ir no bom caminho, os carros nada perderam em termos de performance e espetáculo para os da geração anterior, bem antes pelo contrário, há novas marcas a surgir, que se juntam à Citroen e Ford. A primeira foi a MINI, agora vem aí a Volkswagen.
Mudanças boas e más
O Mundial de Ralis só ganhou estatuto global em 1973, mas a primeira grande alteração só surgiu seis anos depois, em 1979, com a chegada da Audi. A tração total passou a ser permitida, o que foi um ajustamento inevitável, e bem sucedido pois essa foi uma grande evolução, que começou numa marca que deu muito aos ralis.
Tudo se manteve inalterado até 1985, em pleno desenvolvimento dos Grupos B. Nesse ano, foram proibidas as especiais noturnas em terra, uma medida que visava essencialmente a segurança. No ano seguinte tudo se precipitou com os acidentes dos Grupos B, e no final do ano, estes foram banidos. A escalada incontrolável das performances destes carros, chegaram a amedrontar inclusivamente alguns pilotos que confessavam não ter mãos para "aqueles bichos".
Os Grupo A passaram a pontificar no Mundial, e depois de se ter visto Alen, Kankkunen, Biasion e companhia a guiar carros com mais de 500 cavalos, de repente, passaram a guiar outros com bem menos de metade da potência. As coisas evoluíram, e o choque que os adeptos sentiram com a passagem dos grupos B para os A, foi-se desvanecendo com o tempo, e com o aparecimento de algumas boas máquinas, como por exemplo o Lancia Super Delta ou o Toyota Celica 4WD e mais tarde o Subaru Impreza e o Ford Escort Cosworth. Por essa altura, no início dos anos 90 já poucos se lembravam dos Grupos B de sete anos antes, e o espetáculo pelas estradas de todo o mundo, ganhava novo fôlego.
Dos super Grupo A aos WRC
As alterações no WRC continuaram, como por exemplo em 1993, com o registo para as equipas e mínimo de participações, uma medida que denotava o cada vez maior profissionalismo entre as equipas. Entre 1993-1996 passaram a existir controlos cada vez mais apertados nas assistências, o que mais tarde conduziu ao sistema de parque de assistência único, uma boa medida, que contribuiu para redução de custos e melhoria da segurança.
Após uma década de Grupos A como "pontas de lança", em 1997 nasceu uma nova fórmula, os World Rally Cars, no que foi uma forma inteligente de atrair mais construtores, e a seduzir ainda mais público pois os carros passaram a ser, novamente, autênticos protótipos, agradáveis à vista, e ainda mais espetaculares.
Em 1998 surgiu a cronometragem ao décimo de segundo, o que era inevitável atendendo à competitividade crescente do desporto, e que proporcionou, nesse ano, no Rali de Portugal, a menos diferença de sempre na história dos ralis, na prova portuguesa, quando Colin McRae bateu Carlos Sainz por apenas 2.1s.
Em 1999, passou a existir uma classificativa final com pontos extra e transmissão televisiva, no que foi uma das medidas que se revelou um autêntico desastre, originando a que o campeonato de construtores fosse decidido por uma tempestade repentina.
No ano seguinte, em 2000 os ralis passaram a ter um formato de cinco dias, no que foi um conceito demasiado ambicioso, mas um passo enorme rumo à compreensão do público em geral sobre este desporto, numa medida que Todt e Mouton querem reavivar, e só mesmo os custos adicionais em tempo de crise podem colocar de lado.
Medidas polémicas
Em 2002, passou a haver ordem inversa de partida, uma medida discutível e uma má opção quando imposta em todos os ralis. Em 2004 o calendário foi alargado ao Japão, o que se revelou errado, já que os japoneses sempre foram grandes construtores de automóveis, mas no seu próprio país o interesse pela prova nunca foi muito grande, quando comparado, por exemplo, com provas como o Monte Carlo, Portugal, Finlândia ou Grã-Bretanha.
Em 2005 nasceu o SupeRally, uma medida audaciosa e polémica, que aumentou o espetáculo para os adeptos, mas permitiu, por exemplo, que um piloto que não completou todo o percurso da prova, fosse ao pódio no Rali de Monte Carlo de 2006, o que sucedeu com Sébastien Loeb. A questão é simples: Os adeptos e todos os interessados no fenómeno dos ralis ganharam mais ou perderam com o que Loeb fez após a sua desistência no primeiro dia de prova para chegar ao pódio? Certamente, uns ganharam porque apostam no espetáculo, outros perderam porque preferem a 'verdade' desportiva'. Polémico, no mínimo.
Em 2006 passaram a ser admitidas equipas independentes no WRC, uma medida pouco subtil para disfarçar o número reduzido de construtores. Com os custos já a 'arder', em 2008, surgiu o fornecedor único de pneus, uma medida corajosa de controlo de custos que resultou bem e que conduziu aos programas Pirelli Star Driver e, mais tarde, WRC Academy.
Novo fôlego
Em 2009 foram admitidas equipas WRC com um único concorrente, no que foi uma continuação bizarra do registo de equipas independentes. Finalmente, em 2011, a nova fórmula dos World Rally Cars, uma medida corajosa mas bem-sucedida da FIA para atender aos problemas ecológicos do desporto, apesar da falta de consenso entre os construtores sobre a fórmula que preferiam. 2011 fica também marcado pela Power Stage, uma novidade que aumentou o entretenimento, mas que se baseou no receio de que os ralis pudessem estar a tornar-se desinteressantes. Desconfiamos que a única razão para que muitos ralis tenham sido desinteressantes (felizmente, não todos) foi um senhor chamado Sébastien Loeb.
Enfim, depois das nuvens negras que pairaram sobre a modalidade, mesmo num contexto económico difícil, parece haver condições para o crescimento da modalidade, e com o surgimento de novas marcas, só falta mesmo extrema luta pelas vitórias.
Autosport