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"Luta social vai acentuar-se porque há gente a reagir"

Rotertinho

GF Ouro
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"Luta social vai acentuar-se porque há gente a reagir"


O início do segundo mandato do PS foi marcado por uma série de alianças "contra-natura", a que Sócrates chama "coligações negativas" do conjunto da Oposição. O que levou o PCP, por exemplo, a votar a favor da suspensão do Código Contributivo? Pelas mesmas razões do CDS?

Teve razões diferenciadas, mas o PCP não propunha a revogação pura e simples do código, mas alterações, porque tinha algumas malfeitorias para os trabalhadores. O primeiro-ministro falou em coligações negativas, mas deveria ter alguma prudência, porque o que se verificou foram coligações "positivas" entre PS, PSD e CDS - primeiro, no Orçamento de Estado, depois no PEC (Programa de Estabilidade e Crescimento).

O Comité Central do PCP considerou o combate ao défice "uma mistificação", alegando que está em causa a retirada de direitos sociais. Mas não é necessário reduzir o défice para que o Estado tenha condições para desenvolver uma política social?

É importante a redução do défice, mas pode ser feita por duas vias: cortando cegamente na despesa ou potenciando a receita. O que o Governo propõe é, fundamentalmente, cortar na despesa e investimento público, desvalorizar pensões, congelar salários, reduzir serviços públicos. É a visão errada. Nós propomos a via do crescimento. Não é martirizando quem paga habitualmente a factura da crise - assalariados, reformados, micro e pequenos empresários - e deixando intocáveis os responsáveis por ela.

Então qual é a despesa pública que se pode cortar?

Precisamos de alguma flexibilidade em relação ao défice, que permita mais investimento público. Já perguntei várias vezes ao primeiro-ministro o porquê da imposição [de 3% do PIB]? "Porque a União Europeia manda" - é a resposta.

Bruxelas aprovou o PEC com reservas sobre a possibilidade de Portugal reduzir o défice. Admite que serão necessários mais sacrifícios?

A opção nacional é congelar os salários e aumentar as exportações. A Alemanha também tem essa matriz, mas exporta submarinos, aviões, alta tecnologia. Nós exportamos sapatos e papel. Não é comparável. Há outros dois motores de desenvolvimento: o mercado interno - que envolve milhares de pequenas empresas e muitos postos de trabalho - e o aumento do consumo. Dos três factores essenciais - exportações, mercado interno e consumo - o Governo agarra-se a um. Num quadro de concorrência feroz, em que cada país, mesmo no quadro da UE, está a tratar da sua vida, num país fragilizado, com um aparelho produtivo destruído... Os alemães têm metalomecânica e siderurgia. E nós, o que temos? Tudo foi destruído!

Como encara o plano de privatizações previsto no PEC? Compromete a manutenção do papel do Estado na Economia?

Para qualquer perspectiva de desenvolvimento, o Estado precisa de alavancas económicas. Não vou sequer invocar a Constituição, que define um modelo de economia mista, com forte sector público empresarial. Foram privatizadas várias empresas. O que ganhou o país? Ganhou a Galp, os Amorim, os espanhóis, os italianos. Mas o país o que ganhou? Ganharam alguns ,que hoje até estão entre as maiores fortunas. Quando forem vendidas ao desbarato as empresas previstas no PEC - a preços que interessem ao capital - o que vai sobrar? Quando houver outra dificuldade económica ou problemas com a dívida, o que se fará? Aumentar os sacrifícios dos portugueses? É essa a preocupação que temos em relação ao futuro: qual vai ser o recurso do Estado. O país ficará em situação dramática.

Prevê maior conflitualidade social?

O que hão-de fazer os trabalhadores quando os seus direitos são postos em causa? Os ideólogos da Direita vão criando a ideia das inevitabilidades, de que não há dinheiro para nada, que o melhor é a resignação. Mas as pessoas percebem que se mantêm intocáveis os privilégios, as mordomias e os lucros fabulosos. Supreendentemente, muita gente está a reagir. A luta social vai desenvolver-se tendo em conta a realidade.

O maior problema é o desemprego, que o PCP sempre defendeu como sendo estrutural. Como se sai da crise, se o próprio PEC prevê quase 10% de desemprego em 2013?

O desemprego é uma questão estrutural, mas o desenvolvimento económico é central para resolver ou agravar o problema. Quando falamos na defesa do aparelho produtivo nacional, também pensamos no emprego. A previsão da taxa de desemprego no PEC revela má consciência, porque sabem que não valorizando o aparelho produtivo a consequência é manter o nível de desemprego. E a precariedade. Mais de um milhão de portugueses, a maioria jovens, tem vínculos precários.

Nem o PEC nem o Orçamento de Estado dão resposta ao problema?

Não. Têm uma visão monetarista, economicista, de usar a crise para fazer pagar a factura a quem menos pode. Procuram aguentar, mas não resolvem.

Há empresas públicas nas quais será reduzido o pagamento de prémios e bónus aos gestores e o Estado está a propor o mesmo em empresas participadas. Mas o que pode o Estado fazer quando se trata de empresas privadas?

A medidas de redução de privilégios são saudáveis, porque ninguém entende que em tempo de crise existam uns nababos a conseguir bónus. Há dias, calculei os bónus previstos na REN. Corrrespondiam ao salário de 20 anos de um trabalhador que recebe salário mínimo. É escandoloso! Quanto ao sector privado, não peçam ao capital para não pagar bem a quem o serve bem. A moralização aqui não entra, nem o moralismo. Hoje cada vez mais o capital não tem pátria, nem tem coração. Tem apenas o objectivo de ter lucro e mais lucro.

E também não tem regulação...

Quando a crise rebentou, os países mais poderosos reuniram-se. E até em Portugal o primeiro-ministro se declarou indignado com o neoliberalismo, anunciando regulação e combate aos off-shores. Passado este tempo todo, o que ficou dessas proclamações? Até a UE abdicou de qualquer intervenção.


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