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Que país é este?

mjtc

GF Platina
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Fev 10, 2010
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Somos o país das start-ups. Da geração empreendedora, da vaga de jovens agricultores e da nova geração de cientistas e empresários. Esta é pelo menos a imagem que Portugal insiste em mostrar quase todos os dias nos jornais e nas televisões. Pena que este seja também o país onde uma mãe ainda tenta vender o próprio filho para ganhar uns milhares de euros.

Depois de ter passado pela guerra na Bósnia, na Irlanda do Norte, no País Basco ou no Médio Oriente, pensava que a minha capacidade de indignação já estava mais treinada pela profissão. Enganei-me. Não sei se será da idade, mas nesta semana voltei a sentir uma revolta desmedida por causa de uma notícia. Todos os dias em que tive de ler e reler nos noticiários os detalhes da história de uma mãe que simulou o rapto do próprio filho para o vender, não consegui deixar de me questionar: porque é que isto acontece?

Nesta história não me chegam os factos, preocupam-me mais as razões e a indiferença. É fácil censurar este acto verdadeiramente contranatura para dormirmos com as nossas consciências mais tranquilas. Mais difícil é explicar, tarefa que cabe a nós, jornalistas, e à justiça, porque é que isto ainda acontece em Portugal. Todos noticiámos a história mas poucos tentaram perceber porque é que este não é apenas um caso isolado ou fruto do desequilíbrio emocional de uma mulher.

As fotografias do pequeno Daniel e da irmã, que sem qualquer pudor foram publicadas e exibidas muitas vezes de forma gratuita, são a imagem de um país que tem muito mais para equilibrar do que as contas do Estado. Esta história não deve ser vista nem lida como um caso insólito que aconteceu numa das zonas mais pobres de Portugal. É infelizmente o retrato de uma parte do país que já existia antes da crise e que vai continuar a existir depois dela, mesmo quando a casa estiver arrumada.

Temos estado tão preocupados em pagar as dívidas, e agora em provar que somos modernos, que quase nos esquecemos de ver e mostrar como é a verdadeira terra onde vivemos. Quarenta anos depois da revolução e quase trinta anos depois da entrada para a União Europeia, muito tem sido empurrado e escondido debaixo do tapete. Queríamos à força encaixar Portugal na normalização dos países europeus. Parece que conseguimos!

Histórias como a da família do Daniel na Madeira existem ainda em muitas terras portuguesas. Deveríamos todos olhar de frente para estas notícias e não evitá-las com a desculpa de que são sensacionalistas. Este é o país que geralmente não aparece nos noticiários. Ignorá-lo ou reduzi-lo a um acto isolado é não o querer ver. Enquanto eu viver neste mesmo país onde uma mãe quer vender um filho para ter uma vida melhor, não consigo acreditar no futuro. Cabe-nos a todos inverter esta história e fazer que Portugal seja um dia, de facto, aquilo que mostramos nas capas dos jornais.

Dinheiro Vivo.
 
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