• Olá Visitante, se gosta do forum e pretende contribuir com um donativo para auxiliar nos encargos financeiros inerentes ao alojamento desta plataforma, pode encontrar mais informações sobre os várias formas disponíveis para o fazer no seguinte tópico: leia mais... O seu contributo é importante! Obrigado.

Mandado de detenção europeu. Estados-membros

santos2206

GForum VIP
Entrou
Jul 12, 2014
Mensagens
2,454
Gostos Recebidos
19
[h=2]A notificação, pelo Reino Unido, da sua intenção de se retirar da UE não tem como consequência que a execução de um mandado de detenção europeu emitido por este Estado-Membro deva ser recusada ou diferida
[/h]JusJornal, N.º 31, Secção Penal / Acórdão do Dia , Outubro 2018, Editora Wolters Kluwer

JusNet 207/2018



Comentário ao Acórdão TJUE 19 de setembro de 2018, no processo C-327/18


Na falta de motivos sérios e comprovados para acreditar que a pessoa que é objeto desse mandado corre o risco de ser privada dos direitos reconhecidos pela Carta ou pela decisão-quadro (1) na sequência da saída do Estado-Membro de emissão da União, o referido mandado deve ser executado enquanto esse Estado-Membro fizer parte da União.

Em 2016, o Reino Unido emitiu dois mandados de detenção europeus (a seguir «MDE») contra RO (o primeiro, em janeiro de 2016 e, o segundo, em maio de 2016) para efeitos de procedimento penal pelos crimes de homicídio, incêndio e violação. RO foi detido na Irlanda com base nestes MDE. Encontra-se em regime de detenção desde 3 de fevereiro de 2016. RO opôs-se à sua entrega pela Irlanda ao Reino Unido, designadamente por questões relacionadas com a saída do Reino Unido da União Europeia.
A High Court (Tribunal Superior, Irlanda) julgou improcedentes todas as alegações apresentadas por RO, com exceção das relativas às consequências do Brexit. Por conseguinte, pede ao Tribunal de Justiça que esclareça se, tendo em conta que, em 29 de março de 2017, o Reino Unido notificou a sua intenção de se retirar da União, e atendendo às incertezas quanto aos acordos que poderão estar em vigor após a saída do Reino Unido, deve recusar a entrega ao Reino Unido de uma pessoa que é objeto de um MDE, mesmo que a entrega fosse, de outro modo, obrigatória.
O Tribunal de Justiça recorda, antes de mais, que, tendo em conta o princípio fundamental da confiança mútua entre os Estados-Membros, subjacente à decisão-quadro sobre o MDE, a execução do MDE constitui o princípio e a recusa de execução uma exceção que deve ser objeto de interpretação estrita.
Em seguida, o Tribunal de Justiça salienta que a notificação por um Estado-Membro da sua intenção de se retirar da União em conformidade com o artigo 50.º TUE não tem como efeito suspender a aplicação do direito da União nesse Estado-Membro e que, consequentemente, as disposições da decisão-quadro e os princípios da confiança e do reconhecimento mútuos inerentes a esta última continuam plenamente em vigor nesse Estado até à sua saída efetiva da União.
Por conseguinte, o Tribunal de Justiça conclui que a simples notificação por um Estado-Membro da sua intenção de se retirar da União não é uma circunstância «excecional» suscetível de justificar uma recusa de executar um MDE emitido por esse Estado-Membro. Tal consequência constituiria uma suspensão unilateral das disposições da decisão-quadro e seria contrária à sua redação segundo a qual cabe ao Conselho Europeu
declarar uma violação, no Estado-Membro de emissão, dos princípios enunciados no artigo 2.° TUE (2) , para efeitos da suspensão do MDE.
Em contrapartida, o Tribunal de Justiça declara que incumbe ainda à autoridade judiciária de execução examinar se existem motivos sérios e comprovados para acreditar que, após a saída do Estado-Membro de emissão da União, a pessoa que é objeto desse MDE corre o risco de ser privada dos seus direitos fundamentais e dos direitos decorrentes, em substância, da decisão-quadro.
A este respeito, o Tribunal de Justiça sublinha que o Reino Unido é parte na Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais e que a continuação da sua participação nesta convenção não está de forma alguma ligada ao facto de pertencer à União. Além disso, é também parte na Convenção Europeia de Extradição, de 13 de dezembro de 1957, e integrou, no seu direito nacional, outros direitos e obrigações atualmente contidos na decisão-quadro.

Por conseguinte, o Tribunal de Justiça considera que, em tais circunstâncias, a autoridade judiciária de execução pode presumir que o Estado-Membro de emissão do MDE aplicará, em substância, o conteúdo dos direitos decorrentes da decisão-quadro aplicáveis ao período posterior à entrega, após a saída desse Estado-Membro da União. Só perante indícios tangíveis suscetíveis de demonstrar o contrário é que as autoridades judiciárias de execução podem recusar a execução do MDE. Segundo o Tribunal de Justiça, não se afigura que tais indícios existam, mas cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificá-lo.

(19-9-2018 | curia.europa.eu)

(1) Decisão-Quadro 2002/584/JAI do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros – Declarações de alguns Estados-Membros aquando da aprovação da decisão-quadro (JO 2002, L 190, p. 1).


(2) O artigo 2.° TUE prevê que: «A União funda-se nos valores do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores são comuns aos Estados-Membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres».
 
Topo