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- Out 11, 2006
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Foi há nove anos que António, hoje com 55, sofreu um desgosto amoroso, desamparou-se e acabou por perder o emprego. Esteve um ano a dormir ao relento. "Era muito frio, o nariz quase congelava", conta-nos. Até que encontrou o sítio onde dorme há oito anos.
"A minha casa é ali naquele buraco debaixo da estrada". Aponta para um descampado escuro, próximo da Igreja do Grilo, em Xabregas, Lisboa. "Tapei com madeiras e agora até tem porta, por causa dos ratos que iam lá mexer nas coisas", diz ao JN, equilibrado em duas bengalas. "Eu tomo banho nos balneários, faço a barba, tento andar asseado e, prontos, não perdi a minha dignidade", afirma. "Gostava de ter uma casa dentro do que eu possa pagar e até estou inscrito na câmara, mas eles consideram isto habitação provisória", confessa, antes de soltar o lamento: "disseram-me que a Helena Roseta é inacessível".
António é apenas um dos muitos sem-abrigo que todas as noites recebem apoio das equipas de rua da Comunidade Vida e Paz. Na noite de quinta-feira, uma das mais frias deste Outono, o JN acompanhou uma dessas equipas num circuito com cerca de 15 paragens em becos, largos, estações ou terrenos transformados em lixeiras.
Os voluntários sabem onde dormem estas pessoas sem tecto e conhecem a maior delas pelo nome. É uma população que nos últimos tempos tem vindo a aumentar. "Antes, eram pessoas que estavam mais ligadas a problemas de toxicodependência, alcoolismo ou doenças mentais, mas actualmente já aparece o problema do desemprego", reconhece Celestino Cunha, psicólogo e responsável pelo trabalho de rua.
Minutos depois do encontro com António, a carrinha estaciona junto à entrada da estação de Santa Apolónia e rapidamente é cercada por gente que pede leite, sandes, cobertores, roupa. Álvaro Feliciano, de 51 anos, é um dos que aceita roupa para se proteger em mais uma gélida noite a dormir em cima de cartões. Conta que esteve preso 13 anos e desde que saiu - já lá vai ano e meio - não conseguiu arranjar emprego. "Tenho o cartão de cidadão, mas mal o mostro há várias formas de saberem. É um bocado complicado", confessa, frustrado pela consequência dos erros passados.
Pouco antes da meia-noite, nova paragem na rua de São Mamede, mesmo em frente ao Ministério das Obras Públicas. Ali, dormem todos os dias cinco pessoas, entre as quais uma septuagenária. O circuito prossegue, com paragens e assistências em vários locais. Até terminar, já perto das duas da manhã, na Gare do Oriente, onde os sem-abrigo são às dezenas.
Carlos Rocha, coordenador desta equipa de rua, trabalha de dia como bancário e há sete anos que, durante a noite, é voluntário nestas ajudas. Já vi um pouco de tudo. "Às vezes, temos de criar uma barreira para não irmos abaixo", confessa.
Jornal Notícias
"A minha casa é ali naquele buraco debaixo da estrada". Aponta para um descampado escuro, próximo da Igreja do Grilo, em Xabregas, Lisboa. "Tapei com madeiras e agora até tem porta, por causa dos ratos que iam lá mexer nas coisas", diz ao JN, equilibrado em duas bengalas. "Eu tomo banho nos balneários, faço a barba, tento andar asseado e, prontos, não perdi a minha dignidade", afirma. "Gostava de ter uma casa dentro do que eu possa pagar e até estou inscrito na câmara, mas eles consideram isto habitação provisória", confessa, antes de soltar o lamento: "disseram-me que a Helena Roseta é inacessível".
António é apenas um dos muitos sem-abrigo que todas as noites recebem apoio das equipas de rua da Comunidade Vida e Paz. Na noite de quinta-feira, uma das mais frias deste Outono, o JN acompanhou uma dessas equipas num circuito com cerca de 15 paragens em becos, largos, estações ou terrenos transformados em lixeiras.
Os voluntários sabem onde dormem estas pessoas sem tecto e conhecem a maior delas pelo nome. É uma população que nos últimos tempos tem vindo a aumentar. "Antes, eram pessoas que estavam mais ligadas a problemas de toxicodependência, alcoolismo ou doenças mentais, mas actualmente já aparece o problema do desemprego", reconhece Celestino Cunha, psicólogo e responsável pelo trabalho de rua.
Minutos depois do encontro com António, a carrinha estaciona junto à entrada da estação de Santa Apolónia e rapidamente é cercada por gente que pede leite, sandes, cobertores, roupa. Álvaro Feliciano, de 51 anos, é um dos que aceita roupa para se proteger em mais uma gélida noite a dormir em cima de cartões. Conta que esteve preso 13 anos e desde que saiu - já lá vai ano e meio - não conseguiu arranjar emprego. "Tenho o cartão de cidadão, mas mal o mostro há várias formas de saberem. É um bocado complicado", confessa, frustrado pela consequência dos erros passados.
Pouco antes da meia-noite, nova paragem na rua de São Mamede, mesmo em frente ao Ministério das Obras Públicas. Ali, dormem todos os dias cinco pessoas, entre as quais uma septuagenária. O circuito prossegue, com paragens e assistências em vários locais. Até terminar, já perto das duas da manhã, na Gare do Oriente, onde os sem-abrigo são às dezenas.
Carlos Rocha, coordenador desta equipa de rua, trabalha de dia como bancário e há sete anos que, durante a noite, é voluntário nestas ajudas. Já vi um pouco de tudo. "Às vezes, temos de criar uma barreira para não irmos abaixo", confessa.
Jornal Notícias
