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Arguido dos vistos gold beneficiou familiar de ministra

Feraida

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Ministra da Justiça não esclarece se teve algum papel na atribuição da nacionalidade portuguesa a estudante.

Suspeito foi apanhado nas escutas a queixar-se de pressões da magistrada.

Daniel Rocha

As pressões do principal arguido do processo dos vistos gold, António Figueiredo, aceleraram e limaram arestas no processo de concessão de nacionalidade a um familiar da ministra da Justiça, Francisca Van Dunem.

O caso remonta ao final de 2013, altura em estava prestes a expirar a autorização de residência do filho de um sobrinho da governante, que na altura desempenhava funções de procuradora-geral distrital de Lisboa.

Mário Alves da Costa, de 20 anos, era estudante e queria ir ter com a família a Angola nesse Natal, mas via os dias a passar e nada de o assunto se resolver.

Apesar de estar a estudar em Portugal, se fosse podia não conseguir voltar a entrar, explicou ao PÚBLICO o jovem.


Como em muitos casos que aparecem documentados neste processo dos vistos, em que alguém conhece sempre outro alguém disposto a interceder por um conhecido seu, também a família de Mário Costa, cujo pai é sobrinho de Francisca Van Dunem, tinha conhecimentos que lhe permitiam olear os sinuosos canais da burocracia portuguesa.


É assim que se põe em campo uma reputada advogada angolana, Paula Godinho.

Próxima do presidente do Instituto dos Registos e Notariado, António Figueiredo, não hesita em ligar-lhe para lhe pedir “um carinho”.

Como este já estava a ser investigado por suspeitas de corrupção e tráfico de influência, entre outros crimes, foi apanhada nas escutas da Polícia Judiciária.

“Ele é filho de muito boas famílias, isso posso eu garantir-te.

São pessoas de bem”, insiste a jurista.

O presidente do IRN alerta-a para a existência de problemas no processo de obtenção de nacionalidade, que se desvanecem, porém, quando a sua interlocutora explica que o pai de Mário Costa é familiar “da Francisca, da vossa procuradora-geral-adjunta”.


“Ah. Hum. Ai é, da Francisca Van Dunem?

Amanhã telefono directamente para o doutor Manuel Palos, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras”, promete António Figueiredo, falta uma dúzia de dias para o Natal.

O seu empenho irá dar frutos: cinco dias mais tarde o director nacional dos Estrangeiros e Fronteiras, Manuel Palos, igualmente arguido neste processo, assina a certidão que atesta que Mário Costa reside legalmente em Portugal desde Outubro de 2003.

Objectivo: obter a nacionalidade e com ela o cartão de cidadão e o passaporte.


É verdade que em 2010 a não renovação atempada de uma autorização de residência tinha trazido ao jovem o dissabor de uma multa de 295 euros, e que um despacho do próprio Manuel Palos determinava que, nos casos de caducidade do direito de residência, a contagem de prazos para efeitos de aquisição de nacionalidade era interrompida.


Mas segundo o Ministério Público, o dirigente dos Estrangeiros e Fronteiras fazia a António Figueiredo os favores que este lhe pedia, por temer ser afastado do cargo pelo então ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, com quem o primeiro tinha boas relações.

E este caso não constituiu excepção.

“Há ali uma interrupção no tempo de residência, não perfaz o tempo todo… temos mas é que dar a volta a isto”, concede Manuel Palos.


António Figueiredo entra em stress quando percebe que, apesar de todas as suas pressões, os serviços podem não conseguir despachar tudo a tempo do voo do rapaz, marcado para uma quinta-feira, 19 de Dezembro.

Dois dias antes desabafa com um amigo que, tal como ele, virá um ano mais tarde a ser constituído arguido no caso dos vistos dourados, o empresário Jaime Gomes: “Tenho aqui a dra Francisca Van Dunem que tem o sobrinho que precisa da nacionalidade.

Estou com aquilo pendente há dois ou três meses.

Já têm a informação de toda a gente, já falei com o SIS [Serviço de Informações de Segurança], já falei com as polícias todas… tá aquela porcaria pendente no SEF há um mês e tal e não me conseguem dar a informação… já me disseram que a informação que vai ser dada é favorável, já me disseram que iam dar há oito dias, há quinze dias.

Já não tenho paciência para isto, é uma coisa inacreditável (…)

Vou ter de falar com o Manuel Palos, tenho a criatura Francisca Van Dunem a dizer que o sobrinho tinha avião marcado para Angola, que não vai passar o Natal a casa porque tenho o raio de uma informação pendente há um mês”.

António Figueiredo chega a desabafar também com o próprio requerente de nacionalidade: “Eu não posso fazer mais, já pressionei junto de todas as entidades”.

Solicitada para o efeito, a ministra da Justiça não quis pronunciar-se sobre a sua intervenção neste caso, tendo remetido qualquer informação para os esclarecimentos que deu ao PÚBLICO a 21 de Janeiro passado sobre uma outra situação envolvendo a aquisição de nacionalidade de uma familiar sua.

Nesse caso, Francisca Van Dunem admitiu ter conseguido atendimento personalizado numa conservatória através de António Figueiredo, para obter esclarecimentos sobre a situação da familiar em questão.

Segundo a ministra, a especialista que a atendeu disse-lhe que não havia hipótese de a interessada conseguir nacionalidade portuguesa, razão pela qual nem chegou a dar entrada nos serviços nenhum pedido nesse sentido.

No caso de Mário Costa, garantiu ter prestado ao PÚBLICO “todos os esclarecimentos relevantes para os factos” – apesar de isso não ter de todo sucedido­, uma vez que se remeteu ao silêncio relativamente a esta situação.


O estudante recorda-se da intervenção de Paula Godinho no processo, mas diz não acreditar que a procuradora tenha recorrido ao mesmo tipo de expedientes: “Não tenho ideia se aconteceu, mas duvido. A nossa relação familiar não é muito próxima”.

A 18 de Dezembro de 2013, véspera da data do seu embarque, António Figueiredo ligou-lhe finalmente com boas notícias: “Atão, isto tem sido um stress.

Complicado, tive que pôr os meus serviços e os dos outros a funcionar.

Que esta gente não responde, como já viu não é fácil.

Já tenho o cartão do cidadão à sua espera e o passaporte fica pronto logo à tarde”.

Mário Costa agradece.

“Um abraço e boas festas”, despede-se o solícito presidente do Instituto dos Registos e do Notariado.

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