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Casa da Música estreia 'Danza preparata' para dizer 'parabéns Mr. Cage'
A Casa da Música vai estrear «Danza Preparata», a sua primeira produção na área da dança contemporânea, uma criação de Rui Horta sobre «Sonatas e interlúdios» de John Cage, para celebrar o 100º aniversário do nascimento do compósito.
«De algum modo isto é um obrigado, um 'parabéns Mr. Cage', é dizermos que ele, que fazia 100 anos agora, está vivo, não está com 100 anos, é muito jovem», afirmou à agência Lusa Rui Horta, lembrando que os coreógrafos «têm uma relação na dança contemporânea muito forte, poderosa, com o legado do Cage».
«Danza preparata» conta com a interpretação ao piano de Rolf Hind, um especialista na obra do compositor norte-americano, «sublime» segundo Rui Horta, capaz de tocar as 16 sonatas e 4 interlúdios quase sem recurso a partitura, e da premiada dançarina Silvia Bertoncelli, que há alguns anos colabora com o coreógrafo português.
O espectáculo, depois de estrear na Casa da Música, no Porto, a 11 de Abril, é apresentado em Guimarães a 14, no âmbito da Capital Europeia da Cultura, e em Lisboa, no auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, a 29.
As «Sonatas e interlúdios», compostas entre 1946 e 1948, são um conjunto charneira no trabalho daquele que muitos consideram o mais importante compositor do século XX.
As peças ainda apresentam traços do processo tradicional de composição, mas encaminham-se na exploração do aleatório, nomeadamente por serem tocadas num piano preparado, ou seja, num instrumento alterado para modificar o seu som tradicional.
Questionado sobre se também estaríamos perante «um corpo preparado» para esta peça de dança, Rui Horta respondeu:
«Da mesma maneira que o Rolf [Hind] coloca dentro do piano dezenas de parafusos, arames e borrachas nós, com este corpo, criamos um dispositivo, dispositivo esse que tem a ver com um certo aprisionamento do corpo.
Por exemplo, há alturas em que não deixamos mexer o tronco, muitas vezes não deixamos mexer uma perna, outras vezes não deixamos que o espaço esteja disponível…».
Este é um processo de subtracção que o coreógrafo traduz «na esperança de que a essa subtracção se adicione depois um nível de criatividade».
É o que, segundo Rui Horta, também acontece com o piano:
«É um instrumento que foi concebido de uma forma tradicional para ser um instrumento de percussão, mas é um instrumento muito versátil e ele ao preparar este piano cria sonoridades extremamente foram do vulgar, que são estranhas, que têm uma estranheza.
E o corpo da dança é também um corpo estranho».
Na sala de ensaio, Silvia Bertoncelli evolui equilibrando pequenos paus entre os braços e o corpo, numa dança que, sussurrou Rui Horta, é «um tango com Cage».
O piano está em cena e a dançarina entra em diálogo de olhar e de movimento com ele.
«Isto não é um solo, é um dueto, há aqui uma relação simbiótica completa entre a música e a dança», explicou Rui Horta.
Para o coreógrafo, o radicalismo conceptual de John Cage mantém-se bem actual: «Ainda ontem estive na internet a ver comentários sobre o Cage e as pessoas digladiam-se, uns defendem o Cage, outros atacam-no.
Ele é, ainda hoje, completamente controverso.
Isso é o melhor elogio que se pode fazer a uma pessoa que já faleceu».
Lusa/SOL