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[h=2]Um requerente de asilo não pode ser submetido a um teste psicológico a fim de determinar a sua orientação sexual
[/h]JusJornal, Editora Wolters Kluwer
JusNet 17/2018



Com efeito, a realização desse teste constitui uma ingerência desproporcionada na vida privada do requerente.




Comentário ao Acórdão TJUE de 25 janeiro 2018, processo C-473/16.
Em abril de 2015, um cidadão nigeriano apresentou às autoridades húngaras um pedido de asilo alegando que receava ser perseguido no seu país de origem em razão da sua homossexualidade. Apesar de essas autoridades terem considerado que as declarações desta pessoa não apresentavam contradições, indeferiram o pedido pelo facto de a peritagem psicológica por elas ordenada a fim de explorar a personalidade do requerente não ter confirmado a orientação sexual alegada por este último.
O requerente de asilo interpôs recurso desta decisão nos órgãos jurisdicionais húngaros alegando que os testes psicológicos da peritagem em causa lesavam gravemente os seus direitos fundamentais sem permitirem apreciar a verosimilhança da sua orientação sexual.

Chamado a conhecer do litígio, o Szegedi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Szeged, Hungria) pergunta ao Tribunal de Justiça se as autoridades húngaras podem apreciar as declarações de um requerente de asilo relativas à sua orientação sexual com base numa peritagem psicológica. Caso o Tribunal de Justiça dê resposta negativa à primeira questão, o órgão jurisdicional húngaro procura igualmente saber se, no entanto, existem métodos de peritagem que as autoridades nacionais possam utilizar para avaliar a credibilidade das alegações apresentadas no âmbito de um pedido de asilo baseado num risco de perseguição em razão da orientação sexual.
No seu acórdão de hoje, o Tribunal de Justiça constata, antes de mais, que a diretiva relativa às condições de concessão do estatuto de refugiado permite que as autoridades nacionais ordenem uma peritagem no âmbito da apreciação de um pedido de proteção internacional com vista a melhor determinar as necessidades reais de proteção internacional do requerente. Todavia, as modalidades de um eventual recurso a uma peritagem devem ser conformes com os direitos fundamentais garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, como o direito ao respeito da dignidade humana e o direito ao respeito da vida privada e familiar.

Neste contexto, não se pode excluir que, quando da apreciação das declarações de um requerente de asilo relativas à sua orientação sexual, certas formas de peritagem se revelem úteis para a apreciação dos factos e das circunstâncias apresentados no pedido e possam ser realizadas sem lesar os direitos fundamentais do requerente. A este respeito, o Tribunal de Justiça sublinha contudo que, no âmbito da apreciação das declarações de um requerente relativas à sua orientação sexual, as autoridades e os órgãos jurisdicionais nacionais não podem basear a sua decisão apenas nas conclusões de uma peritagem e não podem estar vinculados por essas conclusões.

Em seguida, o Tribunal de Justiça constata que, no caso em que a realização de uma peritagem psicológica com vista a apreciar a realidade da orientação sexual de um requerente de asilo é ordenada pelas autoridades nacionais responsáveis pela apreciação do pedido, a pessoa submetida a essa peritagem encontra-se numa situação em que o seu futuro depende estreitamente da resposta que essas autoridades reservarem ao seu pedido. Além disso, uma eventual recusa do requerente de se submeter aos testes em questão pode constituir um elemento importante no qual as autoridades nacionais se basearão para determinar se essa pessoa justificou suficientemente o seu pedido.
Por conseguinte, mesmo que a realização desses testes dependa formalmente do consentimento da pessoa em causa, esse consentimento não é necessariamente livre, dado que é imposto sob a pressão das circunstâncias em que o requerente de asilo se encontra. Ora, nestas condições, o recurso a uma peritagem psicológica para determinar a orientação sexual do requerente constitui uma ingerência no direito dessa pessoa ao respeito da sua vida privada.

Quanto à questão de saber se essa ingerência na vida privada pode ser justificada pelo objetivo que consiste em recolher elementos úteis para apreciar as necessidades reais de proteção internacional do requerente, o Tribunal de Justiça sublinha que uma peritagem só pode ser admitida se for baseada em métodos suficientemente fiáveis, aspeto sobre o qual não incumbe ao Tribunal de Justiça pronunciar-se, mas que foi contestado pela Comissão e por vários Governos. Por outro lado, o Tribunal de Justiça constata que a incidência dessa peritagem sobre a vida privada é desproporcionada em relação a este objetivo. Sobre este aspeto, o Tribunal de Justiça observa nomeadamente que tal ingerência apresenta especial gravidade, na medida em que se destina a revelar os aspetos mais íntimos da vida do requerente.

O Tribunal de Justiça observa igualmente que a realização de uma peritagem psicológica com vista a determinar a orientação sexual de um requerente de asilo não é indispensável para avaliar a credibilidade das declarações do requerente relativas à sua orientação sexual. A este respeito, o Tribunal de Justiça sublinha que, por força da diretiva, perante uma situação em que a orientação sexual do requerente não é justificada por provas documentais, as autoridades nacionais, que devem dispor de pessoal competente, podem basear-se, designadamente, na coerência e na plausibilidade das declarações da pessoa em causa. Por outro lado, esta peritagem tem, na melhor das hipóteses, uma fiabilidade apenas limitada, uma vez que a sua utilidade para efeitos da avaliação da credibilidade das declarações de um requerente de asilo pode ser posta em causa, designadamente nos casos em que, como no caso vertente, as declarações do recorrente não são contraditórias.

Nestas circunstâncias, o Tribunal de Justiça conclui que o recurso a uma peritagem psicológica para apreciar a realidade da orientação sexual alegada de um requerente de asilo não é conforme com diretiva, lida à luz da Carta .

(25-1-2018 | curia.europa.eu)

 
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