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Cidade de Barcelos
Como escreveu Norberg-Schulz, "habitar entre o céu e a terra significa «estabelecer-se» na multiplicidade do entre um e o outro, isto é, concretizar uma situação geral num lugar artificial" ; é nesta medida que, uma situação geral, o atravessar de um rio, se concretizou num lugar artificial - a urbe de Barcelos.
Sendo um ponto favorável de atravessamento, este lugar foi, no baixo Cávado, o preferido dos viandantes desde a época romana; passava por aqui, uma importante via que, segundo Ferreira de Almeida, "seria uma estrada que derivava da via Braga-Porto, (...) cruzava o Cávado em Barcelos e, continuando para noroeste, iria entroncar na «via per loca marítima» . A partir deste local e para norte, seguiria outra via em direcção a Ponte de Lima.
O cruzamento de vias é, tanto no aspecto prático como simbólico, um elemento estruturador do lugar natural, ao criar uma referenciação e, consequentemente, dando significado a esse lugar. A presença do rio, símbolo de dinâmica e gerador de vida, aparece-nos como outro dos factores que favoreceram a fixação do habitat humano.
Surge-nos assim uma fixação humana, a poente da actual Barcelos, no local onde o rio oferecia facilidades para uma travessia a pé, facilitada pela existência de um vau. A época em que se deu a fixação é desconhecida, quer por falta de documentação, quer por ausência de vestígios arqueológicos que pudessem ser datáveis. Porém, o Professor Ferreira de Almeida coloca o seu aparecimento na época alti-medieval, com o nascimento da nacionalidade, refutando, por falta de provas, as teorias de outros autores que nos indiciavam para uma ocupação romana ou até anterior.
O lugar daria também origem ao nome de Barcelos, segundo hipótese bastante credível, do autor já citado, justificada pela existência de topónimos paralelos no Norte de Portugal e na Galiza. Estes nomes designam uma «terra baixa plana» e que, neste caso, será a designação de uma «terra ribeirinha e plana».
Não sendo um local favorável à agricultura, as primeiras implantações humanas na região aparecem em redor deste, na forma de vilas agrárias, das quais foram encontrados vestígios. Estes indícios levam-nos a afirmar que Barcelos nasceu da almocrevia e do comércio, actividades favorecidas pela existência do cruzamento de vias que davam acesso a várias cidades importantes - Braga, Porto, Viana do Castelo, Ponte de Lima, e ao mar; advindo-lhe assim, uma posição estratégica no território.
Os terrenos onde o atravessamento era propício, não permitiam, pela sua estrutura geológica e possível subida das águas, uma fixação duradoura, assim, o desenvolvimento urbano vai fazer-se a nascente, no promontório rochoso e planalto adjacente, que ofereciam melhores condições para uma fixação mais perene e também, pela sua cota superior, um melhor dominar do território.
A primeira notícia documental que nos aparece sobre Barcelos é a sua carta-foral, concedida por D.Afonso Henriques, numa data que se pode situar entre 1156 e 1169. Esta primeira referência, ao pôr Barcelos sobre a alçada real, permite-nos inferir sobre as implicações que daí advêm, quer em termos das leis que a cidade ficava obrigada a cumprir, quer em termos das taxas e impostos que devia pagar. Este foral permite-nos ainda concluir que Barcelos seria já uma "povoação aglomerada, tendencialmente arruada" , já seria esse o significado corrente adquirido pela palavra «villa». O documento confirma-nos ainda que, pelas contrapartidas que a vila teria de dar ao rei, a almocrevia seria a principal actividade, o que é confirmado pelas inquirições de 1220 e 1258.
Tal como era corrente nas vilas medievais, também em Barcelos foi criada uma gafaria à entrada da vila, no local da Fonte de Baixo, perto do ponto onde se atravessaria o rio a vau. Esta gafaria aparece já documentada em 1177, sendo uma das mais antigas de Portugal. Será também nesta época que se constrói uma igreja paroquial, românica, no sítio da actual igreja matriz.
As inquirições de 1258 fornecem-nos preciosas informações sobre a vila, onde esta aparece já com um núcleo urbano, certamente bastante arruado, com a igreja paroquial e o açougue, circundado por arredores como os de Cimo de Vila, de Fundo de Vila e do Vale.
Nesse tempo começava a desenhar-se a estrutura da cidade; a mancha urbana concentrar-se-ia na zona dos actuais largos do Apoio e Dr. Martins Lima. O principal arruamento seria o que ligava o ponto de atravessamento do rio, a poente, à via que se dirigia a Ponte de Lima e Viana do Castelo, a nascente. Esta linha corresponde à actual Rua Direita, que se forma então, assim como as demais ruas no seu enfiamento.
O eixo principal seria cruzado por outros dois de menor importância, mas que estruturariam o desenvolvimento futuro da vila. O primeiro cruzava a rua principal no local do actual Largo do Apoio e daria acesso ao vale e aos campos, a norte, e à igreja paroquial, a sul. O Largo do Apoio ou do poio teria assim, sido o primeiro centro cívico da vila, e apesar de não haver documentos que o provem, a casa do alcaide, localizada nesse largo, actual casa dos Carmonas, poderia ter sido a primeira sede da administração local. O segundo arruamento a cruzar o eixo urbano principal, seria o que partia do actual Largo Dr. Martins Lima e dava acesso ao rio e à fonte. O último cruzamento seria certamente muito antigo, sendo o local designado pela «cruz», topónimo carregado de simbolismo.
É talvez desta época, meados do século XIII, o aparecimento de uma feira no local onde se iniciava a via para Ponte de Lima e Viana do Castelo, consequência das principais actividades, a almocrevia e o comércio; seria o germinar da feira que tornou Barcelos num pólo de atracção de uma vasta zona. Este local manteve-se desde sempre para a feira, com pequenas variações, tal era a sua importância para a cidade.
A gafaria atingiu o seu apogeu na centúria de trezentos, sendo nesta época o seu termo de elevada extensão. Segundo o tombo de 1498, as terras pertencentes à gafaria (a maioria teria sido, certamente adquirida ou doada na época de apogeu), estendiam-se desde "a Facha (Ponte de Lima), a norte, até S. Miguel das Marinhas, junto ao mar, e Minhotães, a sul, significando-nos a extensão da doença e dos legados obtidos".
D.Dinis, em 1298, para recompensar o mordomo-mor do reino e seu diplomata, João Afonso, senhor de Albuquerque, nomeou-o conde e doou-lhe em título esta povoação; João Afonso tornou-se o primeiro conde desta vila.
Passar de vila régia a vila condal, teve uma importância decisiva no evoluir da urbe. O senhor da terra tornou-se exclusivo, o que dá um carácter e uma identidade próprias à vila e seus habitantes. O facto marcou também uma ascensão de Barcelos em relação às povoações vizinhas, já que adquire então um estatuto diferente e uma administração e jurisdição autónomas. Tendo nos seus condes homens poderosos, Barcelos consegue continuadamente, uma influência e um termo de grande importância, atestado pelo lugar de relevo que os seus representantes tinham nas cortes do reino.
As obras feitas por alguns condes mudaram a fisionomia e a estruturação da cidade, tirando importância a alguns locais e arruamentos, para a dar a outros.
Uma das obras que provocou maiores mudanças, a construção da ponte gótica sobre o rio Cávado, é atribuída ao terceiro conde de Barcelos, D.Pedro (1314-1354), filho bastardo de D.Dinis e autor do «Nobiliário». A sua construção ter-se-ia efectuado entre os anos 1325 e 1328, tendo neste último ano sido instituída a capela de Santa Maria da Ponte , na margem sul. A escolha do local prende-se essencialmente com aspectos de natureza geológica e construtiva, já que, "o afloramento rochoso com cota elevada em ambas as margens do rio, permite o lançamento da ponte. A continuação do veio granítico no interior do leito do rio possibilita a colocação dos apoios intermédios sem grandes custos das fundações".
A construção da ponte teve como consequências externas, o reforçar do papel de Barcelos como pólo comercial e local privilegiado de atravessamento do Cávado. Internamente esta obra desvaloriza toda a zona que se situa entre o Largo do Apoio e o antigo atravessamento do rio. Inversamente, toda a zona que se situa entre este Largo e a ponte, ganha uma importância urbana, que não tinha. O referido largo continua a ser a autêntica praça da vila, já que, possivelmente, será aí que os condes terão o seu paço, inclusive, o sétimo conde, D.Nuno Álvares Pereira. Este tinha, na antiga Rua dos Açougues que se iniciava no Largo do Apoio, a sua casa condal, ainda hoje existente, mas certamente com uma configuração já adquirida no séc. XVI.
"Esta modificação do trânsito acentuou o desenvolvimento das antigas ruas transversais que se tornaram principais, ligando-se à Rua Direita que continuou a urbanizar-se e a elitizar-se".
O novo troço do eixo urbano principal, futura Rua de Santa Maria, ligando o Largo do Apoio à igreja, da qual seguia um caminho para a ponte, adquiriu grande força e iria ser no futuro uma linha de desenvolvimento para o novo centro de Barcelos, que se desloca gradualmente do Largo do Apoio para a zona a norte da igreja.
Na rua referida e possivelmente nesta época, é edificada a pequena capela devotada a Santa Maria, de onde adviria o nome da rua, e para a qual tinha sido transferida uma imagem de Santa Gertrudes Beneditina, proveniente da Fonte da Baixo. Na segunda metade do século XIV, segundo Ferreira de Almeida, a sul desta capela, constrói-se o Hospital do Espírito Santo, administrado pelas autoridades municipais, juízes e regedores.
No tempo de D.Pedro iniciaram-se ainda as obras de construção da actual Igreja Matriz, sobre a pequena Igreja Paroquial, e que se prolongaram pelos dois condados seguintes, respectivamente de D.Afonso Telo (1357-1372) e D.Afonso Teles de Menezes (1372-1382).
A partir de 1385, D.Nuno Álvares Pereira, Condestável do reino e um dos homens mais poderosos do país, tornou-se no sétimo conde de Barcelos. Em 1401, por motivo do casamento da sua filha, D.Beatriz Pereira, com D.Afonso, filho bastardo de D.João I, renunciou à posse do condado, para ser entregue como dote ao seu genro.
Nos sessenta anos seguintes D.Afonso administrará o condado como o seu oitavo conde. Entra-se numa nova era para o condado Barcelense, pois o seu novo senhor torna-se gradualmente num dos mais poderosos do reino; além do dote já referido, consegue de seu pai o ducado de Bragança, o condado e ducado de Guimarães e aos quais é acrescentado, posteriormente, o titulo de marqueses de Vila Viçosa, na pessoa de seu filho, D.Fernando I. Barcelos deixava novamente de ter a exclusividade do seu senhor, adquirida com a passagem de vila régia a condal, o que não lhe foi benéfico, já que estes foram preferindo Guimarães e depois Vila Viçosa.
O desenvolvimento da feira, prova da vitalidade económica que então se verificava, leva à publicação de um diploma régio, em 19 de Fevereiro de 1412, criando uma feira anual e foi conseguido «a rrogo do conde dom affomso» . O progresso económico é também patente no aparecimento de uma notória comunidade judaica, documentada desde 1369.
Realizam-se então, obras de grande vulto na vila, patrocinadas por D.Afonso e continuadas pelos seus descendentes. Nos começos do século XV, este alcançou de seu pai, D.João I, carta para poder lançar taxas para os «muros e torres» da vila. A cerca seria terminada nos meados do século XV, como se pode deduzir de uma reclamação, em Cortes, dos representantes de Ponte de Lima.
Desta muralha ainda hoje nos restam alguns, poucos, vestígios, que nos permitem refazê-la com uma pequena margem de erro, quer com a ajuda do desenho de Duarte Darmas e da Planta Militar de 1806, quer pela estrutura actual do centro da cidade, conformado, ao longo dos séculos, pela existência da cerca. Esta possuía três torres, cada uma correspondendo a uma porta da cidade, corolários das vias mais importantes. Actualmente, das três torres, só subsiste a do cimo de Vila.
Existiam ainda, pelo menos dois postigos, dos quais o mais importante era o de Pessegal, defendido por uma pequena torre e por uma barbacã, dando acesso à fonte e ao rio. Na direcção da Fonte de Baixo e Casal de Nil, encontrava-se o postigo do Fundo de Vila, passagem de serviço muito utilizada.
A leitura feita por Maria da Conceição Falcão Ferreira dos documentos de Ponte de Lima, ao tempo do Conde D.Fernando II, permite-nos concluir que as referências que nele se fazem às obras, se referem ao Paço Condal, iniciado no tempo de D.Afonso. Segundo o Professor Ferreira de Almeida os Paços do Concelho são também da segunda metade do Século XV, incluídos nas obras para as quais se lançou talha. Fica assim atestada a importância que adquirira a zona a sul do Largo do Apoio até à ponte, com a implantação destes edifícios, deslocando-se para aí o centro cívico da urbe. É também deste tempo a formação da «Praça da Vila», entre os Paços do Concelho e a Igreja, onde se implantaria o pelourinho da vila, símbolo da lei e da administração.
D.Fernando consegue ainda, em sequência de diligências iniciadas por seu pai, que fosse instituída a Colegiada de Barcelos, em 1464, pelo Arcebispo D.Fernando da Guerra.
Nesta época, aparece também a mais importante casa senhorial medieval - o Solar dos Pinheiros - visível já no desenho de Duarte Darmas, mas cuja construção inicial não tinha ainda o volume que este desenho já apresenta.
A dinâmica que Barcelos adquiriu com a passagem a vila condal, traduzida em edificações, permite-nos afirmar que a sua estrutura como urbe estava já formada, nas suas linhas principais, ao final do século XV, no ultrapassar da idade medieval. O seu centro cívico com as sedes das principais instituições, as principais artérias estruturando o burgo intra-muros e o campo da feira, estavam já delineados.
Seguem-se anos de desgraça para o condado, pois D.Fernando, homónimo de seu pai, décimo conde desde 1478, foi setenciado em Évora (1484) sob acusação de ter conjurado contra D.João II, sendo os seus bens incorporados na coroa, estando neles incluída a vila de Barcelos.
D.Manuel, em 1496, restitui quase todos os bens ao legítimo herdeiro, D.Jaime, reabilitando assim o nome da família.
Durante o condado de D.Jaime, de 1496 a 1532, dão-se acontecimentos na cidade que vão dar um novo fôlego à sua urbanização, o principal dos quais será o milagre do Senhor da Cruz.
Como escreveu Norberg-Schulz, "habitar entre o céu e a terra significa «estabelecer-se» na multiplicidade do entre um e o outro, isto é, concretizar uma situação geral num lugar artificial" ; é nesta medida que, uma situação geral, o atravessar de um rio, se concretizou num lugar artificial - a urbe de Barcelos.
Sendo um ponto favorável de atravessamento, este lugar foi, no baixo Cávado, o preferido dos viandantes desde a época romana; passava por aqui, uma importante via que, segundo Ferreira de Almeida, "seria uma estrada que derivava da via Braga-Porto, (...) cruzava o Cávado em Barcelos e, continuando para noroeste, iria entroncar na «via per loca marítima» . A partir deste local e para norte, seguiria outra via em direcção a Ponte de Lima.
O cruzamento de vias é, tanto no aspecto prático como simbólico, um elemento estruturador do lugar natural, ao criar uma referenciação e, consequentemente, dando significado a esse lugar. A presença do rio, símbolo de dinâmica e gerador de vida, aparece-nos como outro dos factores que favoreceram a fixação do habitat humano.
Surge-nos assim uma fixação humana, a poente da actual Barcelos, no local onde o rio oferecia facilidades para uma travessia a pé, facilitada pela existência de um vau. A época em que se deu a fixação é desconhecida, quer por falta de documentação, quer por ausência de vestígios arqueológicos que pudessem ser datáveis. Porém, o Professor Ferreira de Almeida coloca o seu aparecimento na época alti-medieval, com o nascimento da nacionalidade, refutando, por falta de provas, as teorias de outros autores que nos indiciavam para uma ocupação romana ou até anterior.
O lugar daria também origem ao nome de Barcelos, segundo hipótese bastante credível, do autor já citado, justificada pela existência de topónimos paralelos no Norte de Portugal e na Galiza. Estes nomes designam uma «terra baixa plana» e que, neste caso, será a designação de uma «terra ribeirinha e plana».
Não sendo um local favorável à agricultura, as primeiras implantações humanas na região aparecem em redor deste, na forma de vilas agrárias, das quais foram encontrados vestígios. Estes indícios levam-nos a afirmar que Barcelos nasceu da almocrevia e do comércio, actividades favorecidas pela existência do cruzamento de vias que davam acesso a várias cidades importantes - Braga, Porto, Viana do Castelo, Ponte de Lima, e ao mar; advindo-lhe assim, uma posição estratégica no território.
Os terrenos onde o atravessamento era propício, não permitiam, pela sua estrutura geológica e possível subida das águas, uma fixação duradoura, assim, o desenvolvimento urbano vai fazer-se a nascente, no promontório rochoso e planalto adjacente, que ofereciam melhores condições para uma fixação mais perene e também, pela sua cota superior, um melhor dominar do território.
A primeira notícia documental que nos aparece sobre Barcelos é a sua carta-foral, concedida por D.Afonso Henriques, numa data que se pode situar entre 1156 e 1169. Esta primeira referência, ao pôr Barcelos sobre a alçada real, permite-nos inferir sobre as implicações que daí advêm, quer em termos das leis que a cidade ficava obrigada a cumprir, quer em termos das taxas e impostos que devia pagar. Este foral permite-nos ainda concluir que Barcelos seria já uma "povoação aglomerada, tendencialmente arruada" , já seria esse o significado corrente adquirido pela palavra «villa». O documento confirma-nos ainda que, pelas contrapartidas que a vila teria de dar ao rei, a almocrevia seria a principal actividade, o que é confirmado pelas inquirições de 1220 e 1258.
Tal como era corrente nas vilas medievais, também em Barcelos foi criada uma gafaria à entrada da vila, no local da Fonte de Baixo, perto do ponto onde se atravessaria o rio a vau. Esta gafaria aparece já documentada em 1177, sendo uma das mais antigas de Portugal. Será também nesta época que se constrói uma igreja paroquial, românica, no sítio da actual igreja matriz.
As inquirições de 1258 fornecem-nos preciosas informações sobre a vila, onde esta aparece já com um núcleo urbano, certamente bastante arruado, com a igreja paroquial e o açougue, circundado por arredores como os de Cimo de Vila, de Fundo de Vila e do Vale.
Nesse tempo começava a desenhar-se a estrutura da cidade; a mancha urbana concentrar-se-ia na zona dos actuais largos do Apoio e Dr. Martins Lima. O principal arruamento seria o que ligava o ponto de atravessamento do rio, a poente, à via que se dirigia a Ponte de Lima e Viana do Castelo, a nascente. Esta linha corresponde à actual Rua Direita, que se forma então, assim como as demais ruas no seu enfiamento.
O eixo principal seria cruzado por outros dois de menor importância, mas que estruturariam o desenvolvimento futuro da vila. O primeiro cruzava a rua principal no local do actual Largo do Apoio e daria acesso ao vale e aos campos, a norte, e à igreja paroquial, a sul. O Largo do Apoio ou do poio teria assim, sido o primeiro centro cívico da vila, e apesar de não haver documentos que o provem, a casa do alcaide, localizada nesse largo, actual casa dos Carmonas, poderia ter sido a primeira sede da administração local. O segundo arruamento a cruzar o eixo urbano principal, seria o que partia do actual Largo Dr. Martins Lima e dava acesso ao rio e à fonte. O último cruzamento seria certamente muito antigo, sendo o local designado pela «cruz», topónimo carregado de simbolismo.
É talvez desta época, meados do século XIII, o aparecimento de uma feira no local onde se iniciava a via para Ponte de Lima e Viana do Castelo, consequência das principais actividades, a almocrevia e o comércio; seria o germinar da feira que tornou Barcelos num pólo de atracção de uma vasta zona. Este local manteve-se desde sempre para a feira, com pequenas variações, tal era a sua importância para a cidade.
A gafaria atingiu o seu apogeu na centúria de trezentos, sendo nesta época o seu termo de elevada extensão. Segundo o tombo de 1498, as terras pertencentes à gafaria (a maioria teria sido, certamente adquirida ou doada na época de apogeu), estendiam-se desde "a Facha (Ponte de Lima), a norte, até S. Miguel das Marinhas, junto ao mar, e Minhotães, a sul, significando-nos a extensão da doença e dos legados obtidos".
D.Dinis, em 1298, para recompensar o mordomo-mor do reino e seu diplomata, João Afonso, senhor de Albuquerque, nomeou-o conde e doou-lhe em título esta povoação; João Afonso tornou-se o primeiro conde desta vila.
Passar de vila régia a vila condal, teve uma importância decisiva no evoluir da urbe. O senhor da terra tornou-se exclusivo, o que dá um carácter e uma identidade próprias à vila e seus habitantes. O facto marcou também uma ascensão de Barcelos em relação às povoações vizinhas, já que adquire então um estatuto diferente e uma administração e jurisdição autónomas. Tendo nos seus condes homens poderosos, Barcelos consegue continuadamente, uma influência e um termo de grande importância, atestado pelo lugar de relevo que os seus representantes tinham nas cortes do reino.
As obras feitas por alguns condes mudaram a fisionomia e a estruturação da cidade, tirando importância a alguns locais e arruamentos, para a dar a outros.
Uma das obras que provocou maiores mudanças, a construção da ponte gótica sobre o rio Cávado, é atribuída ao terceiro conde de Barcelos, D.Pedro (1314-1354), filho bastardo de D.Dinis e autor do «Nobiliário». A sua construção ter-se-ia efectuado entre os anos 1325 e 1328, tendo neste último ano sido instituída a capela de Santa Maria da Ponte , na margem sul. A escolha do local prende-se essencialmente com aspectos de natureza geológica e construtiva, já que, "o afloramento rochoso com cota elevada em ambas as margens do rio, permite o lançamento da ponte. A continuação do veio granítico no interior do leito do rio possibilita a colocação dos apoios intermédios sem grandes custos das fundações".
A construção da ponte teve como consequências externas, o reforçar do papel de Barcelos como pólo comercial e local privilegiado de atravessamento do Cávado. Internamente esta obra desvaloriza toda a zona que se situa entre o Largo do Apoio e o antigo atravessamento do rio. Inversamente, toda a zona que se situa entre este Largo e a ponte, ganha uma importância urbana, que não tinha. O referido largo continua a ser a autêntica praça da vila, já que, possivelmente, será aí que os condes terão o seu paço, inclusive, o sétimo conde, D.Nuno Álvares Pereira. Este tinha, na antiga Rua dos Açougues que se iniciava no Largo do Apoio, a sua casa condal, ainda hoje existente, mas certamente com uma configuração já adquirida no séc. XVI.
"Esta modificação do trânsito acentuou o desenvolvimento das antigas ruas transversais que se tornaram principais, ligando-se à Rua Direita que continuou a urbanizar-se e a elitizar-se".
O novo troço do eixo urbano principal, futura Rua de Santa Maria, ligando o Largo do Apoio à igreja, da qual seguia um caminho para a ponte, adquiriu grande força e iria ser no futuro uma linha de desenvolvimento para o novo centro de Barcelos, que se desloca gradualmente do Largo do Apoio para a zona a norte da igreja.
Na rua referida e possivelmente nesta época, é edificada a pequena capela devotada a Santa Maria, de onde adviria o nome da rua, e para a qual tinha sido transferida uma imagem de Santa Gertrudes Beneditina, proveniente da Fonte da Baixo. Na segunda metade do século XIV, segundo Ferreira de Almeida, a sul desta capela, constrói-se o Hospital do Espírito Santo, administrado pelas autoridades municipais, juízes e regedores.
No tempo de D.Pedro iniciaram-se ainda as obras de construção da actual Igreja Matriz, sobre a pequena Igreja Paroquial, e que se prolongaram pelos dois condados seguintes, respectivamente de D.Afonso Telo (1357-1372) e D.Afonso Teles de Menezes (1372-1382).
A partir de 1385, D.Nuno Álvares Pereira, Condestável do reino e um dos homens mais poderosos do país, tornou-se no sétimo conde de Barcelos. Em 1401, por motivo do casamento da sua filha, D.Beatriz Pereira, com D.Afonso, filho bastardo de D.João I, renunciou à posse do condado, para ser entregue como dote ao seu genro.
Nos sessenta anos seguintes D.Afonso administrará o condado como o seu oitavo conde. Entra-se numa nova era para o condado Barcelense, pois o seu novo senhor torna-se gradualmente num dos mais poderosos do reino; além do dote já referido, consegue de seu pai o ducado de Bragança, o condado e ducado de Guimarães e aos quais é acrescentado, posteriormente, o titulo de marqueses de Vila Viçosa, na pessoa de seu filho, D.Fernando I. Barcelos deixava novamente de ter a exclusividade do seu senhor, adquirida com a passagem de vila régia a condal, o que não lhe foi benéfico, já que estes foram preferindo Guimarães e depois Vila Viçosa.
O desenvolvimento da feira, prova da vitalidade económica que então se verificava, leva à publicação de um diploma régio, em 19 de Fevereiro de 1412, criando uma feira anual e foi conseguido «a rrogo do conde dom affomso» . O progresso económico é também patente no aparecimento de uma notória comunidade judaica, documentada desde 1369.
Realizam-se então, obras de grande vulto na vila, patrocinadas por D.Afonso e continuadas pelos seus descendentes. Nos começos do século XV, este alcançou de seu pai, D.João I, carta para poder lançar taxas para os «muros e torres» da vila. A cerca seria terminada nos meados do século XV, como se pode deduzir de uma reclamação, em Cortes, dos representantes de Ponte de Lima.
Desta muralha ainda hoje nos restam alguns, poucos, vestígios, que nos permitem refazê-la com uma pequena margem de erro, quer com a ajuda do desenho de Duarte Darmas e da Planta Militar de 1806, quer pela estrutura actual do centro da cidade, conformado, ao longo dos séculos, pela existência da cerca. Esta possuía três torres, cada uma correspondendo a uma porta da cidade, corolários das vias mais importantes. Actualmente, das três torres, só subsiste a do cimo de Vila.
Existiam ainda, pelo menos dois postigos, dos quais o mais importante era o de Pessegal, defendido por uma pequena torre e por uma barbacã, dando acesso à fonte e ao rio. Na direcção da Fonte de Baixo e Casal de Nil, encontrava-se o postigo do Fundo de Vila, passagem de serviço muito utilizada.
A leitura feita por Maria da Conceição Falcão Ferreira dos documentos de Ponte de Lima, ao tempo do Conde D.Fernando II, permite-nos concluir que as referências que nele se fazem às obras, se referem ao Paço Condal, iniciado no tempo de D.Afonso. Segundo o Professor Ferreira de Almeida os Paços do Concelho são também da segunda metade do Século XV, incluídos nas obras para as quais se lançou talha. Fica assim atestada a importância que adquirira a zona a sul do Largo do Apoio até à ponte, com a implantação destes edifícios, deslocando-se para aí o centro cívico da urbe. É também deste tempo a formação da «Praça da Vila», entre os Paços do Concelho e a Igreja, onde se implantaria o pelourinho da vila, símbolo da lei e da administração.
D.Fernando consegue ainda, em sequência de diligências iniciadas por seu pai, que fosse instituída a Colegiada de Barcelos, em 1464, pelo Arcebispo D.Fernando da Guerra.
Nesta época, aparece também a mais importante casa senhorial medieval - o Solar dos Pinheiros - visível já no desenho de Duarte Darmas, mas cuja construção inicial não tinha ainda o volume que este desenho já apresenta.
A dinâmica que Barcelos adquiriu com a passagem a vila condal, traduzida em edificações, permite-nos afirmar que a sua estrutura como urbe estava já formada, nas suas linhas principais, ao final do século XV, no ultrapassar da idade medieval. O seu centro cívico com as sedes das principais instituições, as principais artérias estruturando o burgo intra-muros e o campo da feira, estavam já delineados.
Seguem-se anos de desgraça para o condado, pois D.Fernando, homónimo de seu pai, décimo conde desde 1478, foi setenciado em Évora (1484) sob acusação de ter conjurado contra D.João II, sendo os seus bens incorporados na coroa, estando neles incluída a vila de Barcelos.
D.Manuel, em 1496, restitui quase todos os bens ao legítimo herdeiro, D.Jaime, reabilitando assim o nome da família.
Durante o condado de D.Jaime, de 1496 a 1532, dão-se acontecimentos na cidade que vão dar um novo fôlego à sua urbanização, o principal dos quais será o milagre do Senhor da Cruz.