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COMPLEMENTO DE PENSÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO"O que disse o tribunal"

santos2206

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Tribunal Central Administrativo Sul, Acórdão de 16 Jan. 2018, Processo 13046/16


Relator: ANA CELESTE CARVALHO .
Processo: 13046/16


JusNet 182/2018

Tendo estado ao serviço do Estado português, no território de Moçambique que então correspondia aos territórios ultramarinos coloniais, o pensionista tem direito à pensão complementar de reforma decorrente dos descontos aí efetuados


COMPLEMENTO DE PENSÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO PORTUGUÊS. A sucessão de Estados não afeta os direitos que tenham sido adquiridos ao abrigo do ordenamento jurídico originariamente cogente, ou seja, do direito constituído do Estado originário ou predecessor, não tendo a aptidão de extinguir os direitos constituídos na esfera jurídica dos cidadãos, nem as respetivas obrigações assumidas pelo Estado. No caso dos autos, o pensionista tem direito a que a pensão complementar de reforma decorrente dos descontos efetuados durante a sua vida ativa no território de Moçambique que então correspondia aos territórios ultramarinos coloniais, seja liquidada, processada e paga pelo Estado português. Com efeito, o pensionista é nacional e residente do Estado originário, tendo adquirido o direito subjetivo reclamado ao abrigo do ordenamento jurídico do Estado originário e que após o fenómeno de sucessão de Estados, deixou de residir no território do Estado sucessor ou criado ex novo, passando a residir no território do Estado originário, sem ter a cidadania do Estado sucessor e sem nunca ter perdido a cidadania do Estado originário, deve afirmar-se a responsabilidade do Estado originário pela salvaguarda e proteção do direito constituído na esfera jurídica de um cidadão seu nacional.


Meio processual

Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 23-09-2015

Texto

I. O M........... de Moçambique foi criado pelo diploma legislativo n.[SUP]o[/SUP] 626, de 01/02/1939, que aprovou os seus Estatutos, instituição que foi depois reestruturada através do diploma legislativo n.[SUP]o[/SUP] 2845, de 28/11/1968, sendo uma instituição de previdência social, configurada como uma pessoa coletiva de utilidade pública, segundo o artigo 1.º dos seus Estatutos.II. Eram obrigatoriamente inscritos como sócios ordinários do M........... de Moçambique, de acordo com o artigo 9.º, n.[SUP]o[/SUP] 1, os "funcionários públicos civis, de ambos os sexos, dos quadros privativos da Província, providos por nomeação permanente ou por contrato, de harmonia com o Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, que não t[ivesse]m completado 40 anos na data da posse".III. Este regime determinava a obrigatoriedade de inscrição e de desconto no M........... de Moçambique, tendo o ora Autor de se inscrever obrigatoriamente no M........... de Moçambique e, inscrito como sócio ordinário, descontava para aquela instituição a respetiva quota no seu vencimento.IV. O M........... de Moçambique era uma instituição de previdência, criada ex lege, no exercício da potestas do Estado português e por força do exercício da potestas, o Autor estava obrigatoriamente inscrito como sócio ordinário do M........... de Moçambique, tendo o Estado português, por via de diploma legislativo, obrigado o Autor a efetuar descontos do seu vencimento para o M........... de Moçambique, tendo em vista a contribuição para a perceção de uma pensão complementar de reforma.V. Tendo o Autor regressado a Portugal antes da independência da República Popular de Moçambique, passando a residir em Portugal, nunca tendo perdido a nacionalidade portuguesa, sendo um cidadão português e requereu e viu deferido o pedido de aposentação pela Caixa Geral de Aposentações, antes da independência, o Autor constituiu na sua esfera jurídica o direito à aposentação num quadro de uma relação jurídica duradoura estabelecida com o Estado português, decorrente da sua inscrição e desconto obrigatório para uma instituição de previdência social.VI. Este enquadramento fáctico-jurídico é determinante da razão que assiste ao Autor quanto ao direito a ver liquidada, processada e paga a pensão complementar de reforma para a qual descontou, pois toda a relação jurídica de aposentação e de previdência estabelecida com o Autor tem como elementos de conexão o Estado português.VII. Quaisquer relações que se mantenham pendentes e por resolver entre Estados soberanos, decorrentes de eventuais obrigações incumpridas de transferências de verbas por algum Estado em relação ao outro, por consequência da independência da República Popular de Moçambique, são relações estranhas e terceiras em relação ao Autor que não prejudicam, nem podem colidir com os direitos constituídos na sua esfera jurídica.VIII. A sucessão de Estados não afeta os direitos que tenham sido adquiridos ao abrigo do ordenamento jurídico originariamente cogente, ou seja, do direito constituído do Estado originário, não tendo a aptidão de extinguir os direitos constituídos na esfera jurídica dos cidadãos, nem as respetivas obrigações assumidas pelo Estado.IX. Todas as demais relações de natureza obrigacional financeira, ao abrigo de institutos jurídicos como o da sub-rogação, o direito de regresso ou de outros instrumentos afins especificamente previstos no direito internacional, são relações entre o Estado português e a República Popular de Moçambique e/ou o M........... de Moçambique, a serem resolvidas pelos instrumentos de direito internacional ou numa esfera de diálogo político, mas a que o ora Autor é totalmente alheio, por não ser parte nessa relação jurídica.X. Não sendo de afastar a possibilidade de resolução do litígio em presença por via política, junto do Estado moçambicano, ou por via legislativa, através da emanação de regime legal, tal não obsta à resposta que é dada pela aplicação do Direito ao caso concreto, em sentido favorável à pretensão do Autor.XI. A discricionariedade legislativa que se reconhece existir ao Estado legislador, nunca poderia ser de molde a eximir as autoridades administrativas de responsabilidades no caso em apreço.XII. A resposta e a resolução do presente litígio é obtida através da interpretação dos factos e da aplicação do Direito, num quadro legal submetido a normas e princípios de direito administrativo, decorrente da relação jurídica de emprego público e respetiva relação consequente de previdência e de aposentação, estabelecidas com o Estado português, assente na obrigação legal emitida pelo Estado português de o Autor ter efetuado o desconto para efeitos de complemento de pensão.XIII. Não se mostra violado o princípio da separação de poderes, previsto no artigo 111.º da Constituição, por a solução do caso assentar nos normativos de Direito positivados e não na criação de Direito pelo Estado-julgador.

Acórdão Completo:
http://jusnet.wolterskluwer.pt/Cont...SQyoJU27TEnOJUtdSk_PxsFJPiYSYAAFXxT2tjAAAAWKE
 
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