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Justa causa de despedimento. DoenÇa falsa

santos2206

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Ola,ao ler este acordão Tribunal da Relação do Porto datado a 13 Fev. 2017,achei o mesmo interessante :

Ler os pontos a vermelho no Relatorio,fundamentação e decisão.

Constitui justa causa de despedimento o comportamento da trabalhadora que falta ou chega tarde ao trabalho, dando como justificação que tinha um cancro na garganta, quando tal não correspondia à verdade


Tribunal da Relação do Porto, Acórdão de 13 Fev. 2017, Processo 7526/15


Texto

Tendo a trabalhadora dito ao empregador e demais colegas que padecia de cancro, quando tal não correspondia à verdade, e em consequência do que aquele lhe permitia alguns atrasos no início da prestação laboral sem exigir justificação dos mesmos, na convicção de que resultavam dos tratamentos a tal doença, violou a mesma os deveres de probidade, lealdade e de boa-fé, consubstanciando tal comportamento justa causa de despedimento.
JUSTA CAUSA DE DESPEDIMENTO. FALSA DOENÇA. Sempre que o comportamento do trabalhador seja suscetível de ter destruído ou abalado essa confiança, criando no empregador dúvidas sérias sobre a idoneidade da sua conduta futura, poderá existir justa causa para o despedimento. No caso em apreço, embora não se mostre provado que a trabalhadora rapou o cabelo para dar mais credibilidade ao cancro na garganta que alegou ter, esta disse à entidade patronal e às colegas de trabalho que padecia de tal doença, situação que manteve durante cerca de dois meses, o que levou a que a entidade patronal tolerasse alguns atrasos na convicção de que tal se devia a tratamentos oncológicos que teria que efetuar. Ora, com tal comportamento a trabalhadora violou de forma grave os deveres de boa-fé e de lealdade na execução da prestação laboral, que comprometem a confiança da entidade patronal na idoneidade da trabalhadora e do seu comportamento futuro, confiança essa que constitui pilar indispensável à possibilidade de manutenção da relação laboral. Deste modo, julga-se lícito o despedimento da trabalhadora.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

..........
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO IMPROCEDENTE, POR NÃO PROVADO, ATENTOS OS FUNDAMENTOS SUPRA ALEGADOS E EM CONSEQUÊNCIA DEVERÁ SER MANTIDA E CONFIRMADA A DOUTA SENTENÇA."
A Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de que as conclusões são a reprodução das alegações, o qua equivale à falta daquelas e não prevendo a lei a possibilidade de omissão das mesmas. E, assim, conclui no sentido da rejeição do recurso.
Notificadas as partes, apenas a Recorrente respondeu, dele discordando e alegando, para tanto e em síntese que: o disposto no art. 81º, n[SUP]o[/SUP] 1, do CPT apenas prevê a obrigatoriedade das alegações, mas não já das conclusões; estas não são uma reprodução daquelas, sendo que contêm o que a Recorrente pretende que seja apreciado pela Relação; a rejeição do recurso ofende o art. 20º da CRP.
Colheram-se os vistos legais.
***
II. Matéria de facto dada como provada pela 1ª instância:
Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte factualidade:
"a) A Trabalhadora foi admitida ao serviço da Empregadora em 08/11/2013, para, sob as ordens e direcção desta, desempenhar as funções inerentes à categoria de aprendiz de pasteleiro - 1º ano. (A)
b) Através de carta registada com aviso de recepção, datada de 17 de Julho de 2015, a Empregadora comunicou à Trabalhadora a instauração de um procedimento disciplinar, com intenção de proceder ao seu despedimento; mais lhe enviando a respectiva nota de culpa, da qual, entre outras coisas, fez constar as seguintes menções:
"(...) 4º
Assim, desde o início do ano de 2014, a trabalhadora arguida falta ou chega tarde ao trabalho, dando como justificação que tinha um cancro na garganta e estava a fazer os respectivos tratamentos médicos. Tendo inclusivamente rapado o cabelo para melhor convencer a entidade patronal e os seus colegas.

Pelo que a atitude da trabalhadora arguida mostrou-se de tal modo convincente que a entidade patronal tudo fazia para lhe facilitar os tratamentos e não exigia qualquer justificação médica.

Contudo, a entidade patronal teve conhecimento no início deste mês de Julho que tudo não passou de uma mentira e que a trabalhadora arguida goza de boa saúde.

Por outro lado, a trabalhadora arguida continua a não cumprir o horário de trabalho, pois chega mais tarde que a hora de entrada e assina como se tivesse chegado a horas.
(...)
15º
Até porque este seu comportamento manifestou igualmente desrespeito e deslealdade para com a sua entidade patronal, que se viu obrigada a assegurar o regular funcionamento da empresa com recurso a trabalho suplementar de outros funcionários, bem como para com os seus colegas de trabalho que, contra todas as expectativas e aquilo que seria desejável, viram o seu trabalho ser substancialmente aumentado. (...)". (B)
c) A Trabalhadora não respondeu à nota de culpa. (C)
d) Em 20 de Agosto de 2015 a Empregadora proferiu decisão final de despedimento com justa causa, com efeitos a partir do dia 02 de Setembro de 2015; que comunicou à Trabalhadora por meio de carta registada, com aviso de recepção por esta recebida no dia 26 de Agosto de 2015. (D)
e) À data da cessação do contrato de trabalho a Trabalhadora auferia a retribuição mensal de 505,00€. (E)
f) A Trabalhadora rapou o seu cabelo. (F)
g) A Trabalhadora nunca padeceu de cancro na garganta. (G)
i) Em consequência do despedimento, a Trabalhadora sentiu-se angustiada, triste e revoltada. (8º)
j) Entre Janeiro e Agosto de 2015 a Empregadora pagou sempre mensalmente à Trabalhadora a quantia de 42,08€, a título de subsídio de natal. (9º)
k) Entre Janeiro e Julho de 2015 a Empregadora pagou sempre mensalmente à Trabalhadora a quantia de 42,08€; a título de subsídio de férias. (9º)"

IV. Fundamentação

1. Salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (arts. 635, n[SUP]o[/SUP] 4, e 639º, n[SUP]o[/SUP] 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, n[SUP]o[/SUP] 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, são as seguintes as questões suscitadas:
- Impugnação da decisão da matéria de facto;
- Justa causa de despedimento;
- Do subsídio de férias proporcional a 2015.

2. Da impugnação da decisão da matéria de facto
A Recorrente discorda da decisão da matéria de facto relativa aos quesitos 1, 2, 3, 4 e 9 da base instrutória, havendo a mesma dado cumprimento aos requisitos previstos no art. 640º, n[SUP]os[/SUP] 1, als. a), b) e c), e 2, al. a), do CPC/2013, pelo que nada obsta à reapreciação pretendida.................


2.3. Assim, e em conclusão das alterações à decisão da matéria de facto, adita-se à matéria de facto provada as als. l), m), n) e o) com o seguinte teor:

l) A partir de dia não concretamente apurado mas situado no período entre 18.05.2015 e 24.05.2015 a Trabalhadora comunicou à Empregadora que tinha cancro na garganta e que estava a efetuar os respetivos tratamentos médicos.
m) O mencionado nas als. F) e l) convenceram a Ré e os colegas de trabalho da Trabalhadora de que esta padecia de cancro na garganta.
n) A Empregadora, na convicção de que a Trabalhadora padecia de cancro e para que esta pudesse efetuar os tratamentos necessários, permitia-lhe chegar após as 16h00, início do horário de trabalho- umas vezes entre as 16h15/16h20 outras entre as 16h30/17h00,- sem lhe exigir qualquer justificação médica.
o) Só no mês de julho ou agosto de 2015 é que a Empregadora teve conhecimento do referido na al. g).
***

3. Da existência de justa causa para o despedimento

Na sentença recorrida entendeu-se não existir justa causa para o despedimento, do que discorda a Recorrente o que sustenta na alteração da matéria de facto. Tendo esta sido parcialmente alterada, importa apreciar se a sentença recorrida, quanto a esta questão, se deve ou não manter.
3.1. Dispõe o artº 351º, n[SUP]o[/SUP] 1, do CT/2009 que constitui justa causa do despedimento "o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho", elencando-se no n[SUP]o[/SUP] 2, a título exemplificativo, diversos comportamentos suscetíveis de a integrarem, designadamente, na al. f), as "falsas declarações quanto à justificação das faltas".
É entendimento generalizado da doutrina e jurisprudência (2) que são requisitos da existência de justa causa do despedimento: a) um elemento subjetivo, traduzido no comportamento culposo do trabalhador violador dos deveres de conduta decorrentes do contrato de trabalho; b) um elemento objetivo, nos termos do qual esse comportamento deverá ser grave em si e nas suas consequências, de modo a determinar (nexo de causalidade) a impossibilidade de subsistência da relação laboral, reconduzindo-se esta à ideia de inexigibilidade da manutenção vinculística (3) .
Quanto ao comportamento culposo do trabalhador, o mesmo pressupõe um comportamento (por ação ou omissão) imputável ao trabalhador, a título de culpa, que viole algum dos seus deveres decorrentes da relação laboral.O procedimento do trabalhador tem de ser imputado a título de culpa, embora não necessariamente sob a forma de dolo; se o trabalhador não procede com o cuidado a que, segundo as circunstâncias está obrigado e de que era capaz, isto é, se age com negligência, poderá verificados os demais requisitos, dar causa a despedimento com justa causa (Abílio Neto, in Despedimentos e contratação a termo, 1989, pág. 45).
Porém, não basta um qualquer comportamento culposo do trabalhador, mostrando-se necessário que o mesmo, em si e pelas suas consequências, revista gravidade suficiente que, num juízo de adequabilidade e proporcionalidade, determine a impossibilidade da manutenção da relação laboral, justificando a aplicação da sanção mais gravosa.
Com efeito, necessário é também que a conduta seja de tal modo grave que não permita a subsistência do vínculo laboral, avaliação essa que deverá ser feita, segundo critérios de objetividade e razoabilidade, segundo o entendimento de um bom pai de família, em termos concretos, relativamente à empresa, e não com base naquilo que a entidade patronal considere subjetivamente como tal, impondo o art. 351º, n.[SUP]o[/SUP] 3, que se atenda ao quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao caráter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que ao caso se mostrem relevantes.
Quanto à impossibilidade prática de subsistência da relação laboral, a mesma verifica-se por deixar de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento da relação laboral, quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, de tal modo que a subsistência do vínculo laboral representaria uma exigência desproporcionada e injusta, mesmo defronte da necessidade de proteção do emprego, não sendo no caso concreto objetivamente possível aplicar à conduta do trabalhador outras sanções, na escala legal, menos graves que o despedimento.

Diz Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 8ª Edição, Vol. I, p. 461, que se verificará a impossibilidade prática da manutenção do contrato de trabalho "sempre que não seja exigível da entidade empregadora a manutenção de tal vínculo por, face às circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações pessoais e patrimoniais que ele implica, representem uma insuportável e injusta imposição ao empregador."
E, conforme doutrina e jurisprudência uniforme, tal impossibilidade ocorrerá quando se esteja perante uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador, porquanto a exigência de boa-fé na execução contratual (arts. 126º, n[SUP]o[/SUP] 1, do CT/2009 e 762º do C.C.) reveste-se, nesta área, de especial significado, uma vez que se está perante um vínculo que implica relações duradouras e pessoais.
Assim, sempre que o comportamento do trabalhador seja suscetível de ter destruído ou abalado essa confiança, criando no empregador dúvidas sérias sobre a idoneidade da sua conduta futura, poderá existir justa causa para o despedimento. Como se diz no Acórdão do STJ de 03.06.09 (www.dgsi.pt, Processo n[SUP]o[/SUP] 08S3085)"existe tal impossibilidade quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre o empregador e o trabalhador, susceptível de criar no espírito do primeiro a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral."

O apontado nexo de causalidade exige que a impossibilidade da subsistência do contrato de trabalho seja determinada pelo comportamento culposo do trabalhador.
Importa, também, ter em conta que o empregador tem ao seu dispor um alargado leque de sanções disciplinares, sendo que o despedimento representa a mais gravosa, por determinar a quebra do vínculo contratual,
.................Assim sendo, e concluindo, procedem nesta parte as conclusões do recurso, devendo, em consequência ser revogada a sentença recorrida na parte em que julgou ilícito o despedimento e em que condenou a Ré, nas consequências do mesmo, quais sejam no pagamento da indemnização de antiguidade e nas retribuições intercalares (desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão) e respetivos juros de mora.


V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em:

A. Alterar parcialmente, nos termos acima expostos, a decisão da matéria de facto.
B. Conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida na parte em que julgou ilícito o despedimento e condenou a Ré, C..., Ldª, a pagar à A., B..., a indemnização em substituição da reintegração, as retribuições desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão e correspondentes juros de mora condenação essa a que se reportam, respetivamente, as als. a), b) e c) do dispositivo constante da sentença recorrida, a qual é, nessa parte, substituída pelo presente acórdão em que se decide julgar ter a A. sido licitamente despedida, com justa causa, e se absolve a Ré dos mencionados pedidos.
C. No mais impugnado no recurso, nega-se-lhe provimento, confirmando-se a sentença recorrida.
Custas, em ambas as instâncias, por ambas as partes, na proporção do decaimento, sem prejuízo todavia do apoio judiciário de que a A. goza.
Porto, 13.02.2017
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