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GF Ouro
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A popularidade dos tribunais bateu no fundo, 60% dos inquiridos diz que trabalham mal. A VISÃO foi perceber porque, numa visita a uma das maiores e mais modernas comarcas do País.
A juíza que preside às sessões do julgamento do presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais, costuma olhar, com frequência, para as imagens que surgem num plasma, colocado de maneira a que só ela as possa ver. Paula Albuquerque serve-se de um circuito interno de televisão para avaliar, ao pormenor, as expressões faciais de arguidos e testemunhas. Para tal, conta com a colaboração de um técnico que opera várias câmaras de videovigilância, a partir de um pequeno e discreto cubículo, situado numa das extremidades da mega-sala de audiências do tribunal Grande Lisboa - Noroeste - é essa a designação da nova comarca-piloto que abrange Sintra, Amadora e Mafra
Este apoio tecnológico permite aos juízes detectar, com grande nitidez, as alterações de fisionomia e, até, a direcção dos olhares dos intervenientes nas sessões. Quando os acusados viram a cabeça na direcção de alguém sentado na plateia, as câmaras focam-no, de imediato. Trata-se de um tipo de informação que pode ser importante para os juízes descobrirem eventuais cumplicidades e quais as perguntas que provocam maior desconforto aos arguidos.
Este é apenas um dos vários procedimentos que ali se praticam e não são habituais, nos tribunais portugueses. É pelo interior do enorme prédio da Domus Iustitiae, situado no alto de um morro, à entrada de Sintra, que circula grande parte dos processos relacionados com a criminalidade violenta na Grande Lisboa. As 400 pessoas que ali trabalham têm de lidar, anualmente, com cerca de 90 mil casos judiciais de toda a espécie. Quem ali entre e se fique apenas pelos longos corredores, bem iluminados por luz natural, ou pelos jardins interiores, ficará com a impressão de que pouco ou nada se passa ali - as pessoas circulam tranquilamente, num espaço muito desafogado. Nada mais enganoso. Para quinta-feira, 25 de Junho, por exemplo, estavam agendados 125 julgamentos para as 22 salas de audiência, distribuídas pelos três pisos da casa de justiça. É para lá dos corredores com acesso restrito, que comunicam com os gabinetes dos magistrados, e das portas que dão acesso às secções, que se encontra o pulmão deste tribunal. Ana Babo, 39 anos, está rodeada por 33 armários altos, cada um com cinco prateleiras cheias de processos. Nestes papéis, está o relato de algumas das mais arrepiantes histórias criminais. A escrivã de Direito confessa-se abalada com aquilo que, por vezes, é obrigada a ler. «Os casos de abusos sexuais de menores mexem comigo», diz. «Há também homicídios com requintes de malvadez, que eu não julgava possíveis.»
Uma colega, que preferiu não se identificar, diz que, muitas vezes, tem vontade de fugir da sala de audiências. «Há crimes tão chocantes que se torna difícil manter o sangue-frio necessário para ouvir as descrições», explica a funcionária judicial. «Não podemos manifestar revolta alguma, seja em relação ao homem que corta a mulher aos bocados, seja perante um simples traficante de droga».
As seis pessoas que trabalham na 2.1 secção criminal lidam com 915 processos por ano - o que dá quase 153 por funcionário. Mais do que suficiente para terem uma ideia clara sobre a evolução da criminalidade. «Antigamente, estranhávamos, quando um caso tinha três arguidos», refere outra escrivã. «Agora são habituais grupos de cinco ou mais jovens.»
Na secção ao lado, o problema da arrumação da papelada parece mais grave - vêem-se processos amontoados aos pés das secretárias. Daniel Costa, 52 anos, administrador do edifício, explica que a constituição da nova comarca Grande Lisboa-Noroeste, em Abril, obrigou a uma redistribuição de processos, uma operação inacabada. «O tribunal tem espaço e equipamento para lidar com um enorme volume de documentos», garante o funcionário que percorre, diariamente, vários quilómetros, ao longo do edifício que conhece como poucos. «Isto é uma pequena cidade, temos 99 casas de banho! »
Apesar da informatização de grande parte das diligências, e do ar arrumadinho das secções, a verdade é que este tribunal ultramoderno continua carregado de papel, tal como acontece noutros juízos mais antigos. Só à secção central, dirigida pela escrivã Maria João, 5o anos, chegam mais de 2 mil documentos por dia. «Em alguns casos, a lei obriga-nos a guardar os processos.» E isso nota-se nos arquivos, onde estão arrumadas, por exemplo, 45 mil acções de execuções, que se encontram pendentes. «Estava prevista a deslocação de funcionários para resolver essa pendência, mas tal não se verificou», lamenta Ana Coelho, a juíza-presidente do tribunal. Para complicar ainda mais a situação, há que referir que o contrato de 20% dos funcionários expira em Setembro. «Espero que essas pessoas, finalmente, formadas e competentes nas funções que desempenham, continuem a trabalhar connosco.» Ana Coelho considera que a população não tem uma ideia justa acerca do trabalho dos tribunais. «Por cada um dos casos que corre mal, há milhares deles que correm bem.»
A procuradora Paula Figueiredo, 55 anos, é coordenadora do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) da comarca Grande Lisboa-Noroeste, que lida com as áreas de Sintra, Amadora e Mafra, incluindo «um corredor, entre Benfica e Sintra, onde ocorrem mais crimes violentos». Paula Figueiredo acredita que é possível vencer a pendência processual. «A minha estratégia é a de tratar rapidamente a pequena e média criminalidade», diz. «A rotina da celeridade deve instalar-se entre funcionários e magistrados.» A coordenadora dá um exemplo prático: antigamente os processos contra desconhecidos entupiam as secções, agora vão directamente para o arquivo. E só de lá saem quando há novas informações.
@ Visão
A juíza que preside às sessões do julgamento do presidente da Câmara Municipal de Oeiras, Isaltino Morais, costuma olhar, com frequência, para as imagens que surgem num plasma, colocado de maneira a que só ela as possa ver. Paula Albuquerque serve-se de um circuito interno de televisão para avaliar, ao pormenor, as expressões faciais de arguidos e testemunhas. Para tal, conta com a colaboração de um técnico que opera várias câmaras de videovigilância, a partir de um pequeno e discreto cubículo, situado numa das extremidades da mega-sala de audiências do tribunal Grande Lisboa - Noroeste - é essa a designação da nova comarca-piloto que abrange Sintra, Amadora e Mafra
Este apoio tecnológico permite aos juízes detectar, com grande nitidez, as alterações de fisionomia e, até, a direcção dos olhares dos intervenientes nas sessões. Quando os acusados viram a cabeça na direcção de alguém sentado na plateia, as câmaras focam-no, de imediato. Trata-se de um tipo de informação que pode ser importante para os juízes descobrirem eventuais cumplicidades e quais as perguntas que provocam maior desconforto aos arguidos.
Este é apenas um dos vários procedimentos que ali se praticam e não são habituais, nos tribunais portugueses. É pelo interior do enorme prédio da Domus Iustitiae, situado no alto de um morro, à entrada de Sintra, que circula grande parte dos processos relacionados com a criminalidade violenta na Grande Lisboa. As 400 pessoas que ali trabalham têm de lidar, anualmente, com cerca de 90 mil casos judiciais de toda a espécie. Quem ali entre e se fique apenas pelos longos corredores, bem iluminados por luz natural, ou pelos jardins interiores, ficará com a impressão de que pouco ou nada se passa ali - as pessoas circulam tranquilamente, num espaço muito desafogado. Nada mais enganoso. Para quinta-feira, 25 de Junho, por exemplo, estavam agendados 125 julgamentos para as 22 salas de audiência, distribuídas pelos três pisos da casa de justiça. É para lá dos corredores com acesso restrito, que comunicam com os gabinetes dos magistrados, e das portas que dão acesso às secções, que se encontra o pulmão deste tribunal. Ana Babo, 39 anos, está rodeada por 33 armários altos, cada um com cinco prateleiras cheias de processos. Nestes papéis, está o relato de algumas das mais arrepiantes histórias criminais. A escrivã de Direito confessa-se abalada com aquilo que, por vezes, é obrigada a ler. «Os casos de abusos sexuais de menores mexem comigo», diz. «Há também homicídios com requintes de malvadez, que eu não julgava possíveis.»
Uma colega, que preferiu não se identificar, diz que, muitas vezes, tem vontade de fugir da sala de audiências. «Há crimes tão chocantes que se torna difícil manter o sangue-frio necessário para ouvir as descrições», explica a funcionária judicial. «Não podemos manifestar revolta alguma, seja em relação ao homem que corta a mulher aos bocados, seja perante um simples traficante de droga».
As seis pessoas que trabalham na 2.1 secção criminal lidam com 915 processos por ano - o que dá quase 153 por funcionário. Mais do que suficiente para terem uma ideia clara sobre a evolução da criminalidade. «Antigamente, estranhávamos, quando um caso tinha três arguidos», refere outra escrivã. «Agora são habituais grupos de cinco ou mais jovens.»
Na secção ao lado, o problema da arrumação da papelada parece mais grave - vêem-se processos amontoados aos pés das secretárias. Daniel Costa, 52 anos, administrador do edifício, explica que a constituição da nova comarca Grande Lisboa-Noroeste, em Abril, obrigou a uma redistribuição de processos, uma operação inacabada. «O tribunal tem espaço e equipamento para lidar com um enorme volume de documentos», garante o funcionário que percorre, diariamente, vários quilómetros, ao longo do edifício que conhece como poucos. «Isto é uma pequena cidade, temos 99 casas de banho! »
Apesar da informatização de grande parte das diligências, e do ar arrumadinho das secções, a verdade é que este tribunal ultramoderno continua carregado de papel, tal como acontece noutros juízos mais antigos. Só à secção central, dirigida pela escrivã Maria João, 5o anos, chegam mais de 2 mil documentos por dia. «Em alguns casos, a lei obriga-nos a guardar os processos.» E isso nota-se nos arquivos, onde estão arrumadas, por exemplo, 45 mil acções de execuções, que se encontram pendentes. «Estava prevista a deslocação de funcionários para resolver essa pendência, mas tal não se verificou», lamenta Ana Coelho, a juíza-presidente do tribunal. Para complicar ainda mais a situação, há que referir que o contrato de 20% dos funcionários expira em Setembro. «Espero que essas pessoas, finalmente, formadas e competentes nas funções que desempenham, continuem a trabalhar connosco.» Ana Coelho considera que a população não tem uma ideia justa acerca do trabalho dos tribunais. «Por cada um dos casos que corre mal, há milhares deles que correm bem.»
A procuradora Paula Figueiredo, 55 anos, é coordenadora do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) da comarca Grande Lisboa-Noroeste, que lida com as áreas de Sintra, Amadora e Mafra, incluindo «um corredor, entre Benfica e Sintra, onde ocorrem mais crimes violentos». Paula Figueiredo acredita que é possível vencer a pendência processual. «A minha estratégia é a de tratar rapidamente a pequena e média criminalidade», diz. «A rotina da celeridade deve instalar-se entre funcionários e magistrados.» A coordenadora dá um exemplo prático: antigamente os processos contra desconhecidos entupiam as secções, agora vão directamente para o arquivo. E só de lá saem quando há novas informações.
@ Visão