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GF Ouro
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Não é difícil imaginar que, criado este precedente, outra lei ordinária venha a restringir, no futuro, os poderes de outros órgãos de soberania. Os dos tribunais, por exemplo.
Por muito que os portugueses não entendam a polémica do estatuto dos Açores, ou por muito que sintam que há coisas mais preocupantes na agenda política, económica e social, uma coisa já perceberam: os partidos, todos os partidos, incluindo a abstenção envergonhada e inexplicável, a não ser por má consciência, do PSD, venderam, por um prato de lentilhas, um pedaço da soberania nacional.
Ou seja, o Presidente Aníbal Cavaco Silva tal como todos os constitucionalistas que se pronunciaram, e todos a seu favor, tem carradas de razão. Insistindo em falar aos portugueses, mesmo depois de – que remédio! – ter promulgado o diploma, Cavaco foi, desta vez, mais claro. Deixou a pele do político no interior do Palácio de Belém e, perante as televisões, vestiu a capa do professor. E explicou. Não está em causa, afinal, nenhuma birra concreta deste Presidente das República. Nem o busílis da questão – ter ou não ter mãos livres para dissolver a Assembleia Regional dos Açores e, consequentemente, demitir o Governo regional - tem, para ele, cabimento concreto. Essa questão nunca se pôs, não se põe e não é previsível que se ponha no futuro.
O problema é o princípio que se cria e o precedente que se abre: uma lei ordinária restringe os poderes constitucionais de um órgão de soberania. Não é difícil imaginar que, criado este precedente, outra lei ordinária venha a restringir, no futuro, os poderes de outros órgãos de soberania. Os dos tribunais, por exemplo. Se convier aos partidos, por hipótese académica, impedir que estes julguem crimes de titulares de cargos públicos…
É incompreensível que, no caso de uma crise grave, e se o PR quiser dissolver os órgãos regionais, tenha, para isso, mais dificuldades legais do que para demitir o Governo da República. Dificuldades que implicam ouvir os principais afectados por essa dissolução. Seria como se um patrão, ao pretender despedir um trabalhador por justa causa, fosse obrigado a perguntar-lhe se ele quer ser despedido. E é absurdo que esta lei, que é ordinária, seja mais difícil de revogar ou alterar do que a própria Constituição. Para mudar a lei fundamental da República, são precisos dois terços dos deputados da Assembleia da República. Mas para alterar o Estatuto dos Açores… a unanimidade não chega! Porque a lei não pode ser alterada sem o acordo dos órgãos açorianos. Que, claro está, nunca concordarão com essa alteração!
Porque é que os partidos embarcaram todos neste barco, aproveitando, já agora, para deixar o odioso do confronto com o PR ao PS? Porque nenhum quer ser visto como entrave à autonomia. Porque ninguém quer perder votos nos Açores. Todos subiram a sua votação nos Açores e querem manter o balanço. O PSD, que foi o único a perder, tem agora uma líder regional – Berta Cabral – aguerrida e populista, ao estilo Alberto João, que nunca perdoaria ao seu partido um voto contra, com o qual teria dificuldade em lidar em futuras campanhas eleitorais. E o PS está refém do sucesso eleitoral absoluto de Carlos César que usou todos os argumentos - há quem diga que até o da ameaça de demissão – para que o essencial do diploma fosse mesmo aprovado. E é esta a história triste de, nas palavras do Presidente, mais uma machadada na «qualidade da nossa democracia».
Aos que diziam que o PR devia preocupar-se com assuntos mais urgentes, Cavaco devolveu, e bem, o argumento: foi a Assembleia da República que começou esta guerra, os deputados é que deviam preocupar-se com assuntos mais urgentes.
E Carlos César, que fez todas as pressões políticas possíveis para obrigar Sócrates a teimar neste entorse legal e neste «golpe de Estado Constitucional» (coloco estas palavras entre comas por se tratar de uma expressão caricatural), faz juz ao seu nome e torna-se uma espécie de pequeno imperador. Na prática, a autonomia torna-se uma semi-independência. A FLA (Frente de Libertação dos Açores, de 1975) não faria melhor.
@ Visão online
Por muito que os portugueses não entendam a polémica do estatuto dos Açores, ou por muito que sintam que há coisas mais preocupantes na agenda política, económica e social, uma coisa já perceberam: os partidos, todos os partidos, incluindo a abstenção envergonhada e inexplicável, a não ser por má consciência, do PSD, venderam, por um prato de lentilhas, um pedaço da soberania nacional.
Ou seja, o Presidente Aníbal Cavaco Silva tal como todos os constitucionalistas que se pronunciaram, e todos a seu favor, tem carradas de razão. Insistindo em falar aos portugueses, mesmo depois de – que remédio! – ter promulgado o diploma, Cavaco foi, desta vez, mais claro. Deixou a pele do político no interior do Palácio de Belém e, perante as televisões, vestiu a capa do professor. E explicou. Não está em causa, afinal, nenhuma birra concreta deste Presidente das República. Nem o busílis da questão – ter ou não ter mãos livres para dissolver a Assembleia Regional dos Açores e, consequentemente, demitir o Governo regional - tem, para ele, cabimento concreto. Essa questão nunca se pôs, não se põe e não é previsível que se ponha no futuro.
O problema é o princípio que se cria e o precedente que se abre: uma lei ordinária restringe os poderes constitucionais de um órgão de soberania. Não é difícil imaginar que, criado este precedente, outra lei ordinária venha a restringir, no futuro, os poderes de outros órgãos de soberania. Os dos tribunais, por exemplo. Se convier aos partidos, por hipótese académica, impedir que estes julguem crimes de titulares de cargos públicos…
É incompreensível que, no caso de uma crise grave, e se o PR quiser dissolver os órgãos regionais, tenha, para isso, mais dificuldades legais do que para demitir o Governo da República. Dificuldades que implicam ouvir os principais afectados por essa dissolução. Seria como se um patrão, ao pretender despedir um trabalhador por justa causa, fosse obrigado a perguntar-lhe se ele quer ser despedido. E é absurdo que esta lei, que é ordinária, seja mais difícil de revogar ou alterar do que a própria Constituição. Para mudar a lei fundamental da República, são precisos dois terços dos deputados da Assembleia da República. Mas para alterar o Estatuto dos Açores… a unanimidade não chega! Porque a lei não pode ser alterada sem o acordo dos órgãos açorianos. Que, claro está, nunca concordarão com essa alteração!
Porque é que os partidos embarcaram todos neste barco, aproveitando, já agora, para deixar o odioso do confronto com o PR ao PS? Porque nenhum quer ser visto como entrave à autonomia. Porque ninguém quer perder votos nos Açores. Todos subiram a sua votação nos Açores e querem manter o balanço. O PSD, que foi o único a perder, tem agora uma líder regional – Berta Cabral – aguerrida e populista, ao estilo Alberto João, que nunca perdoaria ao seu partido um voto contra, com o qual teria dificuldade em lidar em futuras campanhas eleitorais. E o PS está refém do sucesso eleitoral absoluto de Carlos César que usou todos os argumentos - há quem diga que até o da ameaça de demissão – para que o essencial do diploma fosse mesmo aprovado. E é esta a história triste de, nas palavras do Presidente, mais uma machadada na «qualidade da nossa democracia».
Aos que diziam que o PR devia preocupar-se com assuntos mais urgentes, Cavaco devolveu, e bem, o argumento: foi a Assembleia da República que começou esta guerra, os deputados é que deviam preocupar-se com assuntos mais urgentes.
E Carlos César, que fez todas as pressões políticas possíveis para obrigar Sócrates a teimar neste entorse legal e neste «golpe de Estado Constitucional» (coloco estas palavras entre comas por se tratar de uma expressão caricatural), faz juz ao seu nome e torna-se uma espécie de pequeno imperador. Na prática, a autonomia torna-se uma semi-independência. A FLA (Frente de Libertação dos Açores, de 1975) não faria melhor.
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