Um poema pré-histórico

[edu_fmc]

Oh! Que prazer que me dá
Empilhar pedras disformes
Pequenas
Pouco maiores que a mão
Pouco mais pesadas
Que o coração!

Lançá-las a esmo
Sem projecto
Para o tosco montão
Senti-las bater umas nas outras
Com rusticidade
E vê-las rebolar
Para posições mais estáveis
Como se delas fosse a opção
E não da gravidade

E à medida que o montão cresce
Caótico
Disforme
Sentir que o meu espírito voa
Para longe dali
Que cada pedra é uma angústia
Que ali fica sepultada
Uma ideia que se me solta da mão
E voa
À procura do poema a que pertence

E que inocente prazer
É depois ver o merouço
De diferentes perspectivas
Sem outra intenção
Ou dilema
(Críticas não as ouço)
Do que dar-lhe definitiva forma de poema

Julgo eu
Que não sou entendido em Pré-história
Nem
Desta parte
Em História de Arte
Nem de tal tenho pena
Nem fazer doutrina tenho em mente
Que terá assim nascido a poesia
A primeira obra poética
O mais tosco poema
Escrito
Quem diria
Com pedra solta
Certamente

E que terão a mais as pirâmides do Vale de Gizé
Do que este patético amontoado de pedras
Que mal se aguenta de pé?

E que terão a mais a Ilíada e a Odisseia
Do que este controverso poema pré-histórico?
Será que há outro assim em todo o universo?



De: Henrique Pedro