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O trabalhador, de 46 anos, era esperado anteontem em Santa Maria dos Olivais, Tomar, para uma semana de descanso e convívio com a mulher e as duas filhas. Mas, a meio da tarde, um telefonema do patrão deitou por terra todos os sonhos e projectos da família. 'Foi uma tragédia muito grande e estamos todos em choque', adiantou a filha, suspirando de dor. A forma brutal como morreram os seis operários tornou-se ontem conversa de rua nos três concelhos onde residiam – Ferreira do Zêzere, Ourém e Tomar. 'É muito triste ver partir assim pessoas honestas e trabalhadoras, que tanto se esforçaram para ter uma vida melhor', lamenta uma moradora de Caxarias, Ourém.
Referia-se a António e Telmo Lopes, pai e filho, de 55 e 32 anos, que também morreram no acidente. Deixam saudades na freguesia. Para os homenagear, enquanto ex- -elementos da corporação, os Bombeiros Voluntários locais colocaram a bandeira a meia-hast e.
A poucos quilómetros dali, no lugar de Sandoeira, a mulher de António Mendes Coelho, de 49 anos, refugiou-se na moradia para ‘digerir’ em silêncio a perda do marido.
Na freguesia de Chãos, Ferreira do Zêzere, a irmã de Agostinho Correia Antunes, 50 anos, estava anestesiada pela emoção. A mulher do operário não aguentou o choque e teve de ser conduzida ao hospital. 'Estamos todos muito abalados', disse Ana Ribeiro, irmã de Agostinho Antunes.
Para minimizar o sofrimento de quatro das famílias enlutadas, foi disponibilizado apoio psicológico pela Câmara de Ourém. A mulher de António Conceição recebeu o amparo dos técnicos do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Tomar, onde está a tirar um curso. Só aos familiares de Agostinho Antunes, em Ferreira do Zêzere, não tinha ainda sido oferecido qualquer auxílio.
CORPOS CHEGAM HOJE ÀS TERRAS DAS VÍTIMAS
As famílias das vítimas não foram a Espanha. Três responsáveis da empresa onde trabalhavam os seis homens identificaram os cadáveres e o cônsul honorário em Salamanca, Augusto Pimenta, deslocou-se à cidade espanhola para assumir responsabilidades sobre a documentação necessária à trasladação dos corpos para Portugal. 'As autoridades facilitaram os procedimentos legais e garantiram-me que os carros fúnebres chegaram ainda neste sábado a Portugal', disse ao CM, à saída de uma das casas mortuárias. Da parte dos responsáveis da empresa, poucas palavras e menos esclarecimentos. 'Não queremos falar de nada, já basta o que aconteceu', disse um dos patrões, adiantando apenas que a companhia seguradora está a 'tratar do assunto para ser tudo o mais rápido possível.
SOBREVIVENTE REGRESSA A CASA APÓS EXIGIR ALTA MÉDICA
António Leitão abandonou ontem o hospital Rio Carrión, em Palencia, rumo a Leiria, onde reside. Viajou no carro de um dos patrões, Mário Monteiro, que o foi buscar. O camionista e único sobrevivente do acidente na A-62 conseguiu convencer os médicos a dar-lhe alta mas teve de assinar um termo de responsabilidade. 'Estou bem, quero ir para casa. O médico não queria mas eu é que sei', disse ao Correio da Manhã.
António sofreu apenas ferimentos ligeiros, que prefere desvalorizar. Ontem, ainda no hospital, tentava disfarçar o choque emocional que teve quanto soube que tinham morrido seis compatriotas, em especial depois de ver as fotografias nos jornais espanhóis. Não escondia o alívio por ter sobrevivido ao trágico acidente.
Depois, António Leitão falou ao CM da viagem que vai fazer ao Brasil, já programada para este mês, da visita à Amazónia e da preferência pela tranquilidade tropical, longe do asfalto. 'Agora posso rir, porque estou vivo', disse, visivelmente nervoso, lamentando depois, com lágrimas nos olhos, a morte dos seis trabalhadores lusos.
'Eu não posso falar muito porque também ando na estrada e às vezes também abuso um bocado na velocidade', assumiu António Leitão, ainda na cama do hospital de Palencia, onde passou a noite.
Do acidente, o trabalhador só se lembra de que a carrinha 'voou' sobre ele e das palavras de um polícia quando recuperou a consciência: 'Esteja tranquilo que a culpa não foi sua.'
António Leitão dirigia-se para França, para onde transportava um carregamento de peras.
Ontem, as paletes de fruta que o camião transportava ainda estavam a ser removidas da vala para onde caíram após o forte choque, que tombou o pesado. António Leitão, por seu lado, só queria mesmo regressar a Portugal.
'ACIDENTE IMPRESSIONANTE'
O comandante dos bombeiros municipais de Palencia, José Manuel González, disse ao CM que o acidente de anteontem foi 'brutal e impressionante'. Em 27 anos como bombeiro, nunca presenciou nada assim. 'Foi o pior acidente que vimos, havia corpos espalhados pela estrada', referiu. O comandante dos bombeiros lembra que a A-62 é uma estrada 'muito perigosa, com muito trânsito e que regista muitos acidentes'. A única consolação foi retirar António com vida.
'O LEITÃO É UM BOM MOTORISTA'
'Falei com ele pelo telefone e disse-me que está bem. Está connosco desde a fundação da empresa e é um bom motorista', disse ontem Amílcar Sequeira, dono da empresa de transportes onde António Leitão trabalha há dez anos. O motorista da Transportes Hortofrades, de Valado dos Frades, Nazaré, transportava 22 toneladas de pêra. Divorciado, tem dois filhos adultos, é natural de Alpedriz, Alcobaça, e reside em Leiria.
PORMENORES
BERMAS ESTREITAS
A via tem bermas muito estreitas, onde não cabe um veículo pesado. Não tem separadores centrais em toda a extensão. No troço onde ocorreu o acidente há apenas valas com relva e alguns arbustos.
CEMITÉRIO DO ASFALTO
'É o cemitério do asfalto', disse ao CM um enfermeiro do 112 de Palencia, criticando, contudo, a condução dos portugueses. 'Já socorri alguns ao longo dos anos e acho que aceleram de mais. Estão sempre com pressa', disse, salientando que na maioria dos casos que presenciou 'os condutores estavam com horas a mais de estrada e sonolentos'.
PRESSA EM CHEGAR
O acidente aconteceu perto das 15h00, hora de ponta após o almoço. Foi na quinta-feira, dia em que os trabalhadores portugueses, provenientes de várias zonas de Espanha e de França, têm pressa em chegar a casa.
ACÇÕES EM ESTUDO
A Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR) vai analisar os dados dos acidentes com portugueses, em Espanha, para ponderar a realização de acções de sensibilização. A estatística já foi pedida aos espanhóis e visa, sobretudo, apurar a zona de residência da maioria das vítimas.
Francisco Pedro / Manuela Teixeira / F.G.