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Detenção de droga

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Jun 2, 2007
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Artigo de Opinião de Fernanda Palma - “Quem detiver elevadas quantidades de droga coloca-se na posição de poder traficar - e presume-se que trafica”.

Segundo a nossa lei, o consumo de droga não constitui crime. Desde 2000, é uma contra-ordenação a que são aplicáveis coimas ou sanções não pecuniárias, como as proibições de exercer profissão ou actividade, frequentar lugares ou acompanhar pessoas.

Mas a lei determina que a detenção de uma quantidade de droga superior à considerada necessária para o consumo médio diário durante mais de dez dias não é mera contra-ordenação. Entende-se que esse comportamento revela já indícios de tráfico.

Tal solução assenta em duas ideias: o consumo não é crime, embora possa pôr em causa a paz pública e seja até criminógeno; o tráfico implica uma grave perturbação da sociedade e dos seus bens essenciais. Por isso, o perigo da sua verificação é merecedor depena.

Quem detiver elevadas quantidades de droga coloca-se na posição de poder traficar - e presume-se que trafica. A solução da lei é compreensível, mas o dualismo que ela consagra, distinguindo entre consumidor e traficante, gera um hiato.

Será legítimo punir o “consumidor previdente” que acumula uma grande quantidade de droga com a estrita intenção de a consumir? Se aprova desta intenção for possível, continuará a valer a presunção de tráfico e a punição por tal crime?

A contraprova de que não há tráfico deve ser valorada, sob pena de violação do princípio da culpa. Mas essa não é aposição do Tribunal Constitucional, que tem admitido que a presunção de tráfico não se possa afastar, isto é, seja inilidível.

Haverá, assim, um crime de perigo abstracto, em que é irrelevante, para a prova, a verificação da possibilidade efectiva de dano. Ainda que só esteja em causa o consumo, o agente será punido em nome de um ‘perigo de tráfico’ que não será possível refutar.

Num acórdão recente do Supremo Tribunal de justiça admitiu-se aprova do mero fim de consumo. Porém, concluiu-se que subsistiria um “crime de consumo” nessa situação, porque a lei só terá descriminalizado a detenção para consumo em quantidade moderada.

Esta posição rejeita que a intenção da lei foi descriminalizar o consumo e “ressuscita” uma lógica que não identifica o verdadeiro fundamento da incriminação: o perigo de ofensas contra a integridade e a vida de outros seres humanos, que o tráfico acarreta.

O caso de quem detenha uma quantidade considerável de droga com o exclusivo fim de a consumir justifica a oportunidade de provar que não houve tráfico. Reeditar um crime de consumo é contrário à letra e ao espírito da lei.

Sendo adequado distinguir responsabilidades em função da gravidade da conduta e da culpa do arguido, não se poderá punir a mera detenção para consumo nem como tráfico nem como “crime de consumo” - inexistente na lei. Tratar-se-á, isso sim, de contra-ordenação grave.

@ CM
 
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